a Sobre o tempo que passa: agosto 2010

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

9.8.10

Albert Camus. Por Teresa Vieira


O tempo não corre depressa quando o observamos. Talvez haja mesmo dois tempos, o que observamos e o que nos transforma.
Albert Camus


Em nenhum destes tempos, ou em ambos, se reflecte o quanto o sistema em que fomos vivendo também transformou a natureza num capital.

Julgo que todos pensamos em ciclos naturais imperceptivelmente comandados pelo bater do meio-dia dos sinos das aldeias, e, desse modo, é também possível o diálogo com a natureza. Que não restem dúvidas!

Contudo, creio que esquecemos o tempo de um relógio. O tempo sem retornos, o tempo da linha recta e desumana.

É a partir daqui que tomamos plena consciência do quanto a natureza é também um problema espiritual onde acontecem eclipses e as marés vivas de Setembro que se podem antecipar em vontade e sem aviso.

Os tempos a que me refiro são igualmente aqueles que nos diminuem o horizonte, ainda que a maior parte dos livros não refiram, nem expliquem esta tragédia, ela desapossa o homem de si mesmo e quando não, as propostas são integradoras no sistema.

Se se quiser podemos ser todos um local de encontro, mas em que tempo? No que observamos ou no que nos transforma? Ou naquele que se vai processando em libertação logo, logo atrás da porta da utopia?

E esta última paga-se como se paga o guarda-sol na praia a preço que o mercado determina?

Ou ainda existirá alguém que, como um dia li, é tão só que é livre, e é tão livre de si próprio que a sociedade tem medo dele.

É que, em rigor, quando se é assim, faz-se medo a eles que são uma massa informe e enfrenta-se o tempo rectilíneo.

Neste outro tempo surge um tempo enfeitiçado e cheio de muita vida. Um tempo de não desistência.

Contudo não descuremos a perspicácia da frase do António Sérgio: «Os gregos da época de Péricles eram mais cultos do que nós, nós somos mais civilizados do que eles.»

Assim, por aqui coloco o tempo de cultura que é seguramente um tempo de lucidez.

Mas não corresponde este tempo de cultura ao ouvir muitas músicas, ao ler muitos livros ou conhecer muitas coisas ou o próprio ser ou não muito lido se acaso se escreve.

Neste sentido, sou contra a ditadura da superstição da cultura e se assim não fosse seria recusar a cultura do analfabeto, a cultura que vive dentro quando os homens se percebem.

Também não entendo o tempo submerso nos remorsos ao ponto de, em vez de nos aperfeiçoarmos e dessa realidade darmos provas, damos-lhes as forças de serem mais poderosos do que a nossa própria liberdade.

E este tempo é o que observamos ou o que nos transforma? Para não nos afastarmos da frase de Camus?

Julgo que o contributo do livro A Fúria do Tempo nos pode dar uma grainha cheia que nos ensina também a escutar a distância, para que cada um tenha a compreensão do dissemelhante batimento dos dias e, nesse labor, seja imensamente ajudado por Octávio Paz. Por Borges.

Enfim o tempo, o verdadeiro tempo é uma transformação, um processo guerreiro que não se coloca do lado dos que detêm o poder de decisão, nem do outro lado dos que o não possuem.

Tenho para mim que a “classe” dos que não se possuem a si próprios é que é muito grande, quer jurídica quer económica quer enquanto gente simplesmente.

Mascara-se a realidade e os problemas. Admite-se que a natureza e o seu tempo de interpretação, tenha um valor ao sabor da oferta e da procura e não se repudiam as prepotências, nem mesmos as convencionadas como destruidoras.

Assim, o encorajamento da criação na inteligência nuclear da criatividade vive muito num caminho de futuro.

Esta contínua tendência de tudo se projectar em futuros, leva à confusão dos tempos de espera no presente.

Então, talvez também se mostre necessário acrescentar a este tema, que existe um postigo generoso à experimentação em que nós acreditamos, e que não é monolítico, mas antes sedutor, sem tempo nem data, já que é um processo constante e sem fim.

Um processo muito impermeável à manipulação.

Um tempo de tarefa, um tempo de conduta perante os outros.

M. Teresa B. Vieira
Agosto (dia 7) – 2010 – sec XXI

3.8.10

Devaneios filosofantes de Verão à cinta, por causa da ministra alçada e da necessidade do regresso ao divino


Esta desordem bem organizada do estado a que chegámos precisa mesmo de um indisciplinador que não nos atire para uma qualquer anarquia ordenada. Quando os que deviam servir se servem, há que que começar pelo fim, isto é, pelos próprios princípios...

A melhor forma de praticarmos a clareza e a distinção da racionalidade complexa, por entre estas teias de aranha, que crescem pelos dejectos das vacas sagradas, agitados pelos coices dos respectivos vitelos, está, precisamente, na arte da alegoria, expressando ideias abstractas através de metáforas encadeadas...

O pior problema português é o da justiça. Não apenas o da administração da justiça, que esse até um processualista e um ministro resolvem, de ciência certa e poder democrático, mas sobretudo de justiça como estrela do norte da política, como diria Aristóteles, essa ciência de tratar desigualmente o desigual, como sempre se definiu a igualdade dinâmica...

Porque justiça é, desde os greco-romanos, atribuir a cada um o que lhe pertence (suum cuique tribuere), não prejudicar o outro (alterum non laedere) e viver honestamente (honeste vivere). Estou convencido que esses preceitos, ou pré-captos, enquanto fundamentos, não são captados, isto é, compreendidos, pelo pensamento único...

Para os donos do poder, igualdade é estabelecer uma grelha de generalidade e abstracção que, ao não valorizar a diferença da individualidade criativa, nunca é capaz de atingir o universal. Porque até um sargento verbeteiro feito qualquer coisa, nomeadamente ministro decretino, ousa pôr na gaveta da ficha, um Prémio Nobel...

Pior do que isso: a educação ainda não se libertou da instrução! Ainda não assumiu que era preciso libertar o indivíduo que há em cada aluno, através do exemplo e do estímulo de quem pode "docere" e, portanto, ser "doutor", ajudando a crescer por dentro...

As vacas sagradas do colectivismo de seitas, entre comunistas e ex-comunistas, entre catolaicos e despadrados, continua com maus catecismos de imagem, sondagem e sacanagem e nem sequer atingiu que importa cultivar a rebeldia e a insolência do que deveria ser um português à solta...

Foi pena que António Sérgio não tivesse conseguido aplicar os métodos de Dewey no primeiro quartel do século XX. Foi pena que, nessa altura, não reparássemos que um tal de Fernando Pessoa teve a sorte de ser educado no modelo britânico de Durban, ficando muito adiantado no tempo, face ao positivismo serôdio que irmanou o positivismo naturalista de Afonso Costa e Oliveira Salazar...

Os pedagogos salazarentos nem sequer leram "A Igreja e o Pensamento Contemporâneo" de D. Manuel Gonçalves Cerejeira, consideraram Leonardo Coimbra um tresloucado e António Sérgio, um efectivo alienado. Foi talvez por isso que, mesmo depois de Abril, Agostinho da Silva passou nas televisões como um excêntrico a quem devíamos apenas passar a mão pela metáfora...

Educativamente falando, somos todos bastardos da síntese do educacionês vérmico que o colectivo de educacionólogos ditos de Veiga Simão lançou no concentracionismo da Cinco de Outubro, semeando o capitaleirismo pelo país. Por isso, estamos agora entalados entre o Professor Pardal do positivismo do século XIX e o Professor Manitu da falsa metafísica do pós-guerra, tudo com traduções em calão!

O caldo de cultura positivista que nos enreda, de tanto ser anticatólico, acabou por volver-se também em antimaçónico, isto é, continua a secar o essencial da nossa raiz do humanismo cristão e do humanismo laico, perdendo tempo em proibir a metafísica, Deus e os deuses, em nome da falsidade das revoluções, das utopias e do sucedâneo dos esquemas construtivistas dos pós-revolucionários frustrados...

O principal aliado do positivismo é sempre o egoísmo dos que perdem a humildade do mistério e dizem que atingiram o promontório dos séculos na ideologia, na ciência ou no bem-estar...

Nem teologia, nem metafísica, apenas ciência...e ainda por cima da falsa ciência exportada para o terceiromundismo dos que pedem para ser colonizados por um sol na terra...Basta ver quem os américas ou os chinocas escolhem para as respectivas fundações neocoloniais de controlo de um povo através dos subsídios. Nunca deixariam que essas mentalidades reformassem a educação em Washington ou o socialismo de características chinesas em Pequim!