a Sobre o tempo que passa: <span style="font-family:georgia;color:red;">A opacidade de um futuro que se adivinha tumultuoso. Recebido de O.S.</span>

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

1.12.04

A opacidade de um futuro que se adivinha tumultuoso. Recebido de O.S.



Também eu estou convencida de que por vezes me acontece falar de coisas que melhor tratarão as gentes do ofício. Apenas me deixo ir tal como sou nestas lides: tanto mais que estes assuntos do ofício da política de vão de escada, são exactamente aqueles que nos são permitidos ignorar ou evocar ao acaso.

Todavia, alheios, nunca!

Acresce que me recuso a comprar uma inteligência para estas lides ainda que a mesma se venda na feira do relógio ou em qualquer feira que venda produtos de imitação de desígnios.

Como afirmava Montaigne, procuro apenas a ciência que trata do conhecimento de mim próprio e que me instrua no bem morrer e bem viver.

Também procuro uma pátria invencível onde sempre se conspira a independência dos que nela nasceram porque epopeia é a própria insónia vertebrada.

Os dias nunca terminam, nem acabam nunca, de se contar a si mesmos.

Estou cansada.
Sim, os teus olhos são a soberana submissão do relâmpago.
Digo-te:
Nunca os meus serão a mentira que os teus alimenta.


Assim, é normal que eu não vá roer as unhas porque o 1º de Dezembro é hoje.

Prefiro pensar na razão das afinidades genéticas que explicam o mecanismo de actuação dos carnívoros gregários.

Assim, é normal que eu não vá roer as unhas porque o 1º de Dezembro é hoje.

Prefiro pensar qual a razão que leva os seres humanos a serem bem mais adaptativos do que os seus criadores. Será uma homenagem biológica e subserviente ao rato Mickey ?



Como nos ensinou Lorenz, nas populações humanas actuais, os homens têm, a partir da puberdade, ossos e músculos mais longos ao mesmo tempo que, se bem entendi, sofrem do sindroma da cria altricial: ou seja, dependem das crias, dos estímulos-sinais que estas lhe enviam e do valor selectivo dos pares estáveis. Tudo isto em vinculação transversal.

Desconheço se as cabeças arredondadas e os crânios globosos são, ou não, símbolos do seu valor funcional, tendo em conta as suas frustrações por vencer.

Julgo, ainda assim que as gentes tendem a estreitar-se num hiato fóssil que caracterizam esta nova espécie de hominídeos que os fazem supor bípedes e os situa entre os últimos antepassados de que alguns se lembram. Falo dos Australopitheccus, sem ofensa para estes últimos.

Assim, é normal que eu não vá roer as unhas porque o 1º de Dezembro é hoje.

Como compreender que tantas pessoas que nos são alheias, por essência, se venham obstinadamente prender-se à trama da nossa vida?

A resposta não é difícil, em rigor ainda somos muitos por dominar.

Mas condescender com a sua estultícia é em si um acto de alienação. É como alguém que se entrega plenamente à partida de um xadrez viciado e que lhe retira a honorabilidade de um qualquer triunfo por muito estranho ao jogo que depois venha a querer ser.

A opacidade do futuro que se nos apresenta adivinha-se tumultuoso.

Não há fluir quando os personagens são os mesmos ou descendentes ou ascendentes dos que já repudiámos.

Agora, inicia-se o caudal das aparências e os homens sempre ávidos de se confundirem, formulam em si e nos outros, as vontades prementes de permanecerem os mesmos.

E para quê repetir as peripécias? Para quê olhá-las se da grande viagem ninguém nos dá indícios?

E não deve o filósofo levar a sua inquietude aos que a entendam? Ainda que possa triunfar a negação?

Quando alguém nos vir seguir sobre as perigosas escarpas, local por onde não era suposto haver humanos, então sim, a esperança transmite-se e muitas verdades essenciais podem transparecer. Ardentes.

Assim, é normal que eu não vá roer as unhas porque o 1º de Dezembro é hoje.



O Direito não constitui o homem apenas em obrigações, também o legitima e o autoriza; e a única liberdade não é aquela que é específica do direito. Há que pensar em Kant. Assim a liberdade pode surgir como aquilo que permite ao homem sobrepor-se às circunstâncias.

O indivíduo é soberano sobre o seu próprio corpo e a sua própria mente. Stuart Mill não é apenas para ser lido nas horas vagas de vacatura de estranhos processos de politiquice em curso.

Quizá la partida decisiva
Se juegue en la suma
De todas las partidas,
Esa suma que demuestra
Que este juego no es un juego
(…) que desde atrás de la luz (…)
la noche quiere ocupar tambiém el día,
ser presencia total en la luz.

Deste modo Juarroz alerta-nos para a esperança.



É preciso que se diga bem alto que os poemas são pássaros que não têm pouso e que se prometem à vida sabendo o tudo e o quanto.

Há muitas versões de Judas e muito pouco se sabe dos inexplicáveis traidores.

Até uma criança pode doutrinar outra criança.

Assim é normal que hoje, 1º de Dezembro eu não deva mencionar mais nada.

Cego às culpas, o destino pode ser impiedoso com as mínimas distracções, e o meu país hoje mais se parece com um cumprido e largo saguão.

Convençam-me do contrário, se puderem.

O.S.