a Sobre o tempo que passa: Uma flagrante inconstitucionalidade, com que ninguém se rala

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

23.12.07

Uma flagrante inconstitucionalidade, com que ninguém se rala



A política politiqueira encheu-se de pronúncia do Norte. Num dia, Menezes, proclama: "quero desmantelar de vez o enorme peso que o Estado tem e que oprime as pessoas". Logo a seguir, o ministro das finanças acusa-o de anarquista. Entretanto, os dragões perdem na Madeira, o Pidá continua preso, um asteróide vai chocar com o planeta Marte, anuncia-se que Putine, de forma clandestina, é o homem mais rico da Europa e Menezes volta à carga, invocando a "lógica ética" para que se nomeie um PSD para a presidência da Caixa Geral de Depósitos.



Já nos tempos do fim do rotativismo monárquico, havia um Crédito Predial Português, onde, na presidência do mesmo, se sucediam, também de forma rotativa, os ex-chefes do governo regeneradores e progressistas, quando já existia o mesmo sintoma banco-burocrático, bem patente nas reuniões de ontem e anteontem, na sede do Banco de Portugal e na sede da EDP, convocadas pelo ex-ministro do PS, Vítor Constâncio, e pelo ex-ministro do PSD, António Mexia, para a indicação do futuro pesidente do principal banco privado português, onde todos apontam para o actual presidente do nosso principal banco do Estado.








O primeiro-ministro não esteve presente. O ministro das finanças também não. E nenhum deles deve ter falado ao telemóvel sobre a matéria. Nem sequer com o governador do Banco de Portugal. Porque, se assim fosse, todos poderiam confirmar a estreiteza do restrito clube que nos controla e que cabe quase todo na garagem da EDP ao Marquês de Pombal, incluindo minoritários accionistas do BCP que, no dia seguinte, são bancos rivais que lançam sobre o primeiro uma OPA.



Também para todos se tornou patente aquela flagrante inconstitucionalidade que é a da confusão de narizes entre o poder político e o poder económico, onde o primeiro se confunde com a partidocracia do Bloco Central e o segundo, com os controladores das redes "holding" das oligárquicas participações financeiras. Por outras palavras, o nosso situacionismo de bloqueio centralizado cabe todo numa garagem da eléctrica dita nacional e não se confunde com uma transmissão em directo da AR-TV.








A democracia a que chegámos, entupida por esta era dos "managers", com as transmissões enlatadas dos debates parlamentares já está com o "share" do canal esotérico, dado que o clube dos feitores dos ricos, o dos gestores e dos grandes advogados de negócios, já nem sequer tem o recato de não tornar patente esta "golden share" controladora do sistema.


Daí que soe a anedota o título da entrevista de Miranda Calha ao "Semanário": as pessoas que defendem o referendo estão contra a Europa. Ainda pode candidatar-se a um dos lugares que vai ficar vago na administração de um destes bancos privados ou do Estado, geríveis na garagem da EDP, a convite de um ex-ministro de Santana Lopes.