a Sobre o tempo que passa: Contra os que acreditam nas regenerações vindas da cavalariça ou da sacristia...

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

6.2.08

Contra os que acreditam nas regenerações vindas da cavalariça ou da sacristia...


Por razões profissionais, isto é, na preparação de uma arguição de doutoramento, tenho voltado a analisar pausadamente o ambiente de decadência que tanto levou ao assassinato da monarquia como ao suicídio da república, dado que o Estado Novo, porque nunca existiu, sempre esteve dependente de uma constipação mal tratada e acabou por cair com o simples estatelar de uma cadeira, numa varanda voltada para o mar. Por outras palavras, o artigo de Garcia Leandro já foi muitas vezes escrito, muitos anos antes da morte por dentro dos regimes. O reconhecimento da imoralidade de algumas circunstâncias da plutocracia e da incapacidade de autoregeneração dos nossos bonzos, endireitas e canhotos faz parte da rotina analítica dos que não bebem do fino, que constituem a maioria das nossas elites.


Tal como nas vésperas do 5 de Outubro, do 28 de Maio e do 25 de Abril, um quarto de hora antes de morrer, o nosso querido regime ainda está vivo, ainda é uma espécie de magazine. Só que pode continuar vivo por largos anos. A monarquia ainda viveu de 1891 a 1910. A Primeira República, desde a Noite Sangrenta de 1921 ao 28 de Maio de 1926. E o Estado Novo, desde as eleições de Delgado de 1958 até aos cravos de 1974. Agora, a coisa vai ser mais longa, até porque a maior parte dos nossos factores de poder já não são nacionais.


E ninguém espere que, da cavalariça, possa emergir um qualquer general. Ou que, da sacristia, nos possa ser remetido um qualquer cardeal, com a sua ditadura das finanças. Os últimos dois benzidos que, da finança, nos vieram, um deu em jardim com caruncho da madeira e outro foi-se, em aposentadorias, para presidente da ... causa monárquica.


Vale-nos que Zé Miguel Júdice veio alertar-nos para a possibilidade de Marinho Pinto ser o candidato presidencial dos canhotos contra Cavaco, a não ser que ele próprio, também na qualidade de ex-bastonário, se apresente pelos endireitas, mas com o apoio dos bonzos de Sócrates, contra Marinho. Até porque o primeiro-ministro deste nosso desgraçado país onde ninguém a ninguém admira e todos a determinados idolatram (Almada dixit), depois de ter reparado que a luta de invejas substituiu a luta de classes, tratou de copiar os actos do Casino do Estoril, que comprou dois pareceres contra a Direcção-Geral de Saúde, e recorreu a mais um dos catedráticos de direito administrativo, para pedir parecer sobre os respectivos mamarrachos arquitectónicos, já que os doutos de Coimbra parece que tinham sido mobilizados pelo LNEC, para a questão do aeroporto de Alcochete.


Consta que o Ministro das Universidades já mandou a Procuradoria-Geral da República investigar sobre a possibilidade de acumulação desta parecerística com o subsídio sobre a exclusividade de funções docentes. Até porque Manuel Alegre continua a produzir livros de poesia em idênticas circunstâncias...