a Sobre o tempo que passa: Abaixo a política pimba!

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

15.7.08

Abaixo a política pimba!

Perdido entre correcções de pontos, revisões de provas e preparação de arguições e relatórios de júris de mestrados, lá vou cumprindo aquele trabalho silencioso para que o povo me paga, embora sem deixar de, por dever de ofício, ter intervenção científica na análise da realidade política e social. Ainda ontem me chamavam a atenção para a análise literária que correu durante longos minutos do livro de Eduarda Maio, na principal estação televisiva que se dedica à música pimba. Apenas me apetece elogiar o belo trabalho de "agenda setting" dos profissionais que colaboram com Sócrates, porque sabem, de ciência certa, que a boa propaganda não deve parecer propaganda.

Sócrates, com o livro de Eduarda Maio, parece ter conseguido uma reedição do "menino de Boliqueime", com que a falecida Luiza Manuel de Vilhena soube criar o impacto da primeira imagem de Cavaco Silva. Raramente se realça a genialidade desta escritora, antiga candidata a deputada da oposição pelas listas da Comissão Eleitoral Monárquica de 1969, quando eu tive o meu primeiro entusiasmo cívico, embora não tenha acompanhado a notável novelista nos seus apoios ao nascente cavaquismo.

Verifico agora que se repete a criação da mesma imagem do neto e do filho que a maioria silenciosa gostaria de ter, assinalando a sua vitimização pelas circunstâncias de um mundo ingrato. Aliás, algo de semelhante aconteceu à imagem do Zé Manel, dois políticos da mesma geração, hábeis na prestação de serviços e que reflectem uma certa concepção e da vida de Portugal, país intermediário, organizador de eventos, chamem-se cimeira dos Açores ou cerimónias de assinatura do Tratado do Mar da Palha.

Infelizmente, sofrem sempre dos imprevistos de uma qualquer Quinta da Fonte, que eles não provocaram, mas que lhes pode cair em cima, quando, raspado o verniz, há um Portugalório de sempre, o do desleixo, o da moral do sapateiro de Braga, o do enquanto o pau vai e vem, folgam as costas. Afinal, a questão da Apelação, nesses traseiros da magnífica Expo, onde nasceu o Tratado de Lisboa, começa a delinear-se, como uma questão de "gangs", esses cogumelos venenosos que não têm etnia, que levaram a comunidade cigana a dar uma imagem péssima de si mesma, ocultando os importantes esforços que tanto a República como os próprios ciganos têm levado a cabo, para todos vencermos a vergonha da tradicional marginalidade a qyue estava condenada.

Esperemos que o episódio não sirva para continuarmos a lavar as mãos como Pilatos. Mais de cinco séculos de ciganos em Portugal são uma razão suficiente para termos direito a um Portugal cigano, desde que os responsáveis políticos não caiam no "lapsus calami" de notarem que tudo se passou entre ciganos e africanos, sem intervenção directa dos "portugueses", quando as três comunidades são hoje radicalmente portuguesas. Acho que o alto comissariado para as minorias étnicas tem que rapidamente dar um curso de pluralismo a certos responsáveis autárquicos, tal como os especialistas em minorias têm que aprender com os autarcas que estes são as principais vítimas de uma falta de política de reidentificação deste novo Portugal Plural.