a Sobre o tempo que passa: Amanha terminarei esta parte da viagem. E o sol vai nascer de novo.

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

14.10.08

Amanha terminarei esta parte da viagem. E o sol vai nascer de novo.


Sabe tao bem a descoberta, o saber de experiencia feito, mesmo que o teclado nao me deixe cumprir todas as nossas regras ortograficas. Tenho de olhar, sentir e calcorrear. Nao concluir apenas pelo preconceito e o ouvir dizer. Sobretudo, vivendo o mundo que a minha volta se vai estendendo, longe das eiras e das beiras de que vou vivendo. Ai dos que procuram o exotico turisticamente, de qualquer maneira. Porque depressa pode passar-se do deserto radical para um lugar ao sol no nevoeiro de uma republiqueta financeira, lendo despachos sobre o sobe e desce da especulacao financeira e perdendo os fios do equilibrio que nos ligam aos grandes movimentos cosmicos. Nomeadamente aos ritmos profundos que transformam as ideias em correntes de pensamento e concepcoes do mundo e da vida, quando nao em grandes religioes universais. Importa que cada um de nos se assuma como centro do mundo e que, pelo individual da diferenca procure a humilde ambicao de aceder ao universal.

Noto que ja poisei na terceira escala, nesta terra de tufoes, vulcoes e tsunamis, onde o mar e a terra se enrodilham num ceu que desaba em dias de raiva. Por mim, apenas o desejo de procura de um lugar onde, que me de mais espaco para assentar o sonho. Sem as amarras de um tempo que, afinal, nao nos da lugar. Porque ha quem pense gerir imperios sentado no sofa das ordens e das contra-ordens, mandando servicais e capatazes para os cantos mais escondidos de seus pretensos dominios. Ha quem, sentado em seus gabinetes de poder, mande matar e mande morrer pela simples assinatura de um despacho, assente na informacao formal de um senhor director qualquer e aceitando a sugestao do rascunho de decisao que o chefe de gabinete elaborou. Ha quem pense que mandar tem de ser poder mandar matar e mandar morrer. Ha quem continue a dar o nome de substantivo ao velho adjectivo de uma arma que tambem pode disparar em ricochete, e a que todos os poderosos faz ter medo de tambem poder morrer matando.

Apenas digo que ha outros sinais da procura do universal. Mesmo aqui, dentro desta enorme baleia aerea que me permite ser um anonimo lusitano, entre tantas e desvairadas gentes. E la assinei mais nao sei quantos papeis de desembarque para satisfazer o manual do controlo policiesco desta formidavel rede securitaria que esta crescendo para controlar outras redes, na constante guerra dos Estados contra os clandestinos que, por dentro, ao lado e acima dos Estados formais, vao instrumentalizando a pluralidade de pertencas dos individuos.

Para onde vai meu nome? Para que gaveta numero nao sei quantos mil de um qualquer armario concentracionario vai meu carimbo, assim perdido nos aparelhos de analise de poder desta abstracta maquina alimentada pelos impostos e controlada pelos sargentos verbeteiros, pelos chefezinhos de continuos, pelas odaliscas, pelos espioes, pelos muitos comedores de restos? Sobretudo, se eu nao preencher devidamente a ficha controleira com que um qualquer intendente desempregado do gulag ou do tarrafal me quis controlar, vingando-se em persiganga.

Amanha terminarei esta parte da viagem. E o sol vai nascer de novo.