a Sobre o tempo que passa: Barroso, António Sardinha e Alfredo Pimenta, com o cabralismo em fundo e o profeta Daniel em frente

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

10.9.09

Barroso, António Sardinha e Alfredo Pimenta, com o cabralismo em fundo e o profeta Daniel em frente


Foi delicioso o frente a frente entre Barroso e o grupo dos Verdes, liderado por Daniel Cohn-Bendit, com aquele regresso ao confronto do histórico do Mai 68 com um MRPP do "nem mais um soldado pr'ás colónias". Porque Barroso não gostou de ser apelidado como conservador, ele que agora se diz do centro reformador, e invocou como seguro de vida o ter andado nas ruas de Lisboa a clamar contra o colonialismo...

O Zé Manel, o português que, em toda a nossa história mais voou pelas alturas das relações internacionais, suplantando Afonso Costa na SDN, lá deixou que a costela de quem levou os sofás da Faculdade de Direito para a sede do partido do grande educador do proletariado lhe marcasse o ritmo argumentativo. Apenas me recordei de dois grandes esquerdistas que foram activistas da greve académica de 1907, desencadeada pelo avô da actual líder do PSD, o maçon José Eugénio Dias Ferreira. Um deles era António Sardinha, do lado do estudantes republicanos, o tal que sete anos depois há-de ser maurrasiano e extraordinário pensador e polemista, na liderança do Integralismo Lusitano. Honra lhe seja feita, continuou fiel ao estúpido subsolo filosófico do postivismo de Comte que também marcou a secção jacobina do Partido Republicano.

O outro grevista de 1907, ainda mais esquerdista, quando ainda alinhava no anarquismo de Kropotkine, é Alfredo Pimenta que, depois de ser activista, propagandista e "boy" de um dos partidos republicanos, se passou para a exaltada e reaccionária facção monárquica, ainda mais à direita que os integralistas. Tentou ser o filósofo de serviço do Estado Novo, mas nem Cerejeira nem Salazar o consentiram e acabou pró-nazi e sempre excelente polemista e historiador. Pena que se tenha enganado quanto à valia de Fernando Pessoa, quando este deu cabo de Santos Cabral, um subproduto do pimentismo.

Por outras palavras, há uma certa lei da nossa história contemporânea que tem a ver com traumatismos juvenis: quanto mais doença infantil do comunismo, mais reaccionarismo na idade madura. Já tinha sido assim com António Bernardo da Costa Cabral no Clube dos Camilos. E basta eu recordar-me de algumas aparições fantásticas por essas bandas de um tal Manuel Dias Loureiro. Se o Saldanha Sanches e o Garcia Pereira começarem a desfilar os nomes dos camaradas, bem nos continuaremos a rir, sobretudo quando agora se justificam, salientando que faziam tal contra o "social-fascismo" do PCP e que isso de "nem NATO, nem Pacto de Varsóvia" era uma espécie de antecipação da união sagrada do Freitas do Amaral, do Louçã e do Soares contra o Bush.


Sobre a matéria, ainda não me foi dado fazer adequada consulta aos arquivos da CIA e do KGB, e das operações de estratégia indirecta ou de "operation chaos". Ainda me caíam os restos de Gladio, P2, Aldo Moro e pacifismo do "antes vermelhos que mortos". Sempre preferi Soljenitsine, a Carta 77 e a liga anticongreganista de que foi presidente o liberalíssimo grão-mestre, bisavô da Drª Manuel Ferreira Leite...