a Sobre o tempo que passa: Profissão de desgaste rápido= Ser honesto. Recebido de O. A.

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

4.6.05

Profissão de desgaste rápido= Ser honesto. Recebido de O. A.



Ontem fartei-me com a questão - elevada a grande tema político – relativa aos valores auferidos pelo nosso ministro das finanças. Fartei-me e saturei-me. Concordo inteiramente com o que vosso colaborador A. A. escreveu.

Admito que a não explicação mínima de certos factos se possa prestar à maledicência hipócrita que continua a florescer no burgo. Ainda assim não admito uma caça a certas bruxas enquanto todas as restantes, quais mudas e silenciosas criaturas, vão juntando no cofrinho do sótão português ou suiço, todos os tostões que ganham desde o PREC das bruxas até aos dias de hoje, e que são conhecidas e actuais figuras do mando da direita de Portucale.

Desconheço quantos empregados tem o Banco de Portugal e a justificação da utilidade dos mesmos que gostava de ver esclarecida. Também sempre ouvi dizer que para aquelas bandas só se entrava com cunhas e das boas, ao menos para a esmagadora maioria dos lugares.

Todavia, estranho muito que todos os funcionários da instituição que acima referi, não venham a terreiro defender o ministro das finanças, sobretudo por três ordens de razões:

1ª - Todos o bajularam no passado e ninguém ousou pôr em causa a sua competência e honestidade;

2º - De há muitos, muitos anos, todos os funcionários do Banco de Portugal utilizam, usando e abusando, o crédito muitíssimo “barato” que esta Casa oferece para aquisição, nomeadamente de habitações, entre outras vastas regalias;

3º - O silêncio dos caladinhos bem protegidos por esta instituição, face ao ataque ao ministro das finanças é cobarde. É acima de tudo cobarde!



A moral desta cambada que se não dá a conhecer, não obstante muitos deles estarem colocados em cargos de grande visibilidade, a moral desta cambada, dizia eu, é pior do que aquela que assiste aos que praticam a fuga ao fisco como acto de profissionalismo inteligente. Falo daqueles que na TV dizem abertamente que não pagam, nem vão pagar o que devem. Dão a cara desavergonhada para o dizer e logo surge de bandeja o acordo que os protege, caso venham a pagar alguma coisa. E continuam a fazer afirmações sem pudor nenhum e impunemente e enquanto o fisco envia milhares de cartas, acompanhadas de execução fiscal e penhora, a quem lhe deve mais de €250 !

Lembre-se também que, caso o ministro das finanças tivesse “doado” temporariamente ao país a sua reforma, não faltaria quem, além de o achar tolo, acrescentasse: ora, ora, de que vale ele dar mil contitos para o Estado? Se dá é porque pode, e além do mais não aquece nem arrefece ao tal monstro que ele tenta combater. Hipócrita é o que ele é!



Aliás, os senhores deputados que eu sustento há muitíssimos anos, é bem melhor que estejam caladinhos ou digam em hora de "prime time" a todo o país, quantos cargos acumulam e onde e quanto auferem no somatório, para que possam retirar algum peso ao monstro, já que, como são todos muito honestinhos, é favor darem algum dinheirito a quem precisa, e admitam de uma vez por todas que o seu estatuto, na esmagadora maioria, é o de trabalhadores adventícios, como dizia o assessor jurídico do Tempoquepassa, Manel- Belas Artes.

Ontem, também um comentador da TV, criticava sobretudo a questão da falta de ética do senhor ministro e dizia incautamente : é que a questão é moral!

Contudo, este incauto nunca disse que o caso dele também é de acumulação de ordenados. Quem o entrevistava também nenhuma pergunta lhe fez sobre o assunto. Donde, também acumula, visto que ficámos a saber que a maioria silenciosa das bruxas é quem mais se amanha.



Ouvi também uma inteligente senhora, advogada, muito conhecida por acumulação de rendimentos, sobretudo os que lhe chegam via contactos (leia-se “influências”) ou pela própria instituição marital, dizer que um político deve ganhar bem.

Ora minha querida senhora, que deve ganhar bem se trabalhar com competência, todos o sabemos. Desde logo todos os que trabalham nestas condições deviam ganhar bem. Não é só lei do foro para os políticos. Mas a senhora não vê que, se só quem for rico é que pode ser político, então diga lá a senhora, como poria todos os pobres deste país a votarem num rico?

Ó ilustres sabedores da sabedoria sapiente deste país:

Não sabem vossas excelências que pensar é um direito A ADQUIRIR, de preferência antes de falar?

Sabem que mais?, é como o outro que cantou na televisão:

Não, não, sim, sim, talvez!

E depois da cantoria recomendou a sua autobiografia à boa resolução dos problemas do país.

Até parece que nunca cá pôs os pés. Até parece que nem governou com maioria absoluta. Até parece que não sabe que os Lusíadas têm dez cantos. Ou não será o mesmo? Se calhar é isso, eu confundi-me, pois como pode um senhor recomendar todas as soluções para o país contidas na sua própria autobiografia, se quando governou as não aplicou?

Nós não merecemos tanto mal e ainda por cima sempre recaído sobre os mesmos. Sobre os que, mesmo depois de muito lerem, e ao contrário da Yourcenar, mais se recusam a escutar a voz humana.

Ou “isto” tudo à volta dos rendimentos do(s) ministros, é tão só forjado para que se esqueçam todas as Lezírias de Portugal?, os apitos, as imobiliárias, a não-justiça que se pratica como regra, o desgaste rápido com direito a morte súbita pela opção de se ser honesto?

E nós, nós os que achávamos que a vida merecia uma rosa? Por quanto tempo sobreviveremos?

O.A.