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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

5.6.07

A nova maria da fonte, sem temer e sem cavalo, contra o programa de cortar os dedos para que se confisquem os anéis ...


Saldanha Sanches dá uma entrevista crítica sobre a corrupção a uma colorida revista. O sistema treme. José António Barreiros sente que há uma curva qualquer nesse caminho e apresenta queixa ao DIAP sobre a matéria, publicitando-a numa televisão privada, ainda não encerrada por Hugo Chávez e sem elogios de António Braga, com muita Realpolitik.

Há quatro candidatos a bastonário da Ordem dos Advogados. Um deles também é, ao mesmo tempo, candidato à autarquia lisbonense, numa espécie de noivo eterno da democracia, sempre na paragem de autocarro para nos saudar. Marques Mendes procura os papéis que tem em arquivo sobre as senhas de presença nas reuniões da Universidade Atlântica e as facturas da gasolina. Isaltino passa de investigado a investigador e recorda que antes de ser autarca era magistrado, com melhores notas de licenciatura que o seu ex-camarada de Fafe. Mendes recorta a primeira página do "Expresso", onde, quando era supremo mandador da Fábrica de Pólvora, aparecia ao lado de Sócrates, numa qualquer iniciativa pretensamente científica sobre o ambiente, para onde não convidou o Professor Doutor João Ferrão, que afastara do conselho científico dessa espécie de universidade que autarquizara sem direito a vencimento, mas com senhas, avenças a advogadas, refeições pagas e muita gasolina...

Na campanha eleitoral de Lisboa, apenas são notícias os mandatários que vão gotejando, conforme os conselhos dos publicitários que rodeiam os principais candidatos. Entre a campeã de triatlo e a intérprete da telenovela da Maria Laurinda, com passagem por quase todos os principais empresários de advocacia de Lisboa, o teatro continua. O povão teima em desconfiar dos promotores imobiliários, dos construtores de parques de estacionamento e dos instaladores de lombas e semáforos. Ninguém parece querer saber quem são os candidatos a vereadores de cada uma das listas. Interessa mais a Rosa Mota e espera-se, em qualquer momento, a chegada do Emplastro e do Manuel da Bexiga. Consta que Eusébio apenas serve para as presidenciais e para a inauguração dos cuidados de hospitais privados que tem a concorrência do próximo hospital da Caixa Geral de Depósitos e do sistema "multicare". E todos confirmam que não há "lobbies" na defesa de aeroportos alternativos ao da Ota, como aconteceu com os modelos de "public relations" ao serviço do defunto Rio Frio que até recrutaram generais da força aérea que viam ovnis.

Entretanto, todas as notícias que os telejornais transmitem sobre a administração da justiça parecem fazer crescer a confiança do cidadão anónimo nos seus procuradores e nos seus juizes. Franquelim Lobo foi absolvido e a Casa Pia é o adia. Já o departamento de defesa norte-americano, que gere parte de uma base aérea situada em território português, decidiu fazer um protesto original contra as leis sindicais portuguesas, abrindo um concurso público internacional para recrutamento de pessoal onde expressamente excluiu cidadãos de Portugal. Uma comentadora televisiva, caricaturalmente busheira, até explicou, por 250 euros, a circunstância invocando o facto de se tratar de prestação de serviços a um campo de férias, pelo que se excluíam os portugueses, dado que o mesmo se situava em território pátrio. O silogismo abstraía da quilometragem que separa o território português do contenente face às ilhas outrora ditas adjacentes. A malta riu, sobretudo com a autoridade da fonte de contactos directos que insinuou. Consta que, hoje, mais uma multinacional irá fechar as portas numa cidade do interior. Manuel Pinho não comentará, continua a fazendo propaganda a energias alternativas no dia mundial da criança, e o tipo de notícia começa a ser tão rotineiro quanto os atentados nos mercados sunitas de Bagdade.

Vale-me que, nesta tristeza crescente de um quotidiano cada vez mais cinzento, ainda há aulas e alunos, longe dos corredores da burocracia em regime de providências cautelares e golpadas reformistas. Pena que os alunos saibam que o sistema veiga-simonista e gagueiro, com tantas avaliações e grupos de missão, produziu cerca de meia centena de milhar de licenciados desempregados, neste ambiente de esperança em torno da bolonhesa que vai produzir empregabilidade. O Conselho Superior do Ministério Público marcou uma reunião oficial para ler a entrevista política de Saldanha Sanches. Maria José Morgado não estará presente. Viva a flexi-segurança à portuguesa!...

Não reparam os doutos e os becas que, nesta pátria capitaleira e absolutista, com muitos descendentes do marquês, pintados de democracia, a única coisa que até agora salvou os melhores foi poderem furar o bloqueio da falta de avaliação do mérito, através da emigração, para os ex-impérios e para as Europas das sete partidas. Assim, estacionaram cem milhões no Brasil e outros milhões mais escassos nas outras paragens coloniais, enquanto, nos anos sessenta, lá foram dois milhões a caminho da integração europeia.

Agora já nem a salto há válvulas de escape e a panela de pressão vai acumulando vapores de revolta. Espera-se, a qualquer momento, que uma qualquer Maria da Fonte, vestida de "hacker", proteste contra a cabeleira branca de Teixeira dos Santos, introduzindo um vírus mortífero nos computadores do ministério das finanças, para que se acabem com todos os registos do IRS e do IVA. Outros patuleias se preparam para, através do "wireless", produzirem violações no espaço dos tribunais e das polícias. A informação, que a CIA recolheu de forma cuidadosa, explica a razão da recente exclusão de portugueses para trabalho na base terceirense.

A culpa está em termos os governantes, os deputados e os magistrados que merecemos. A coisa apenas pode ser invertida por uma educação que promova a autonomia dos indivíduos. Quando cada um de nós passar a ser uma república soberana que promova regras que se cumpram, bem longe daqueles pleonasmos e placebos que levam os acusados em processos judiciais a declarar que estão de consciência tranquila. Só através do personalismo poderemos esperar que regresse a meritocracia e as escolas de formação de elites, dotadas de adequada "ratio studiorum". As bolonhesas não passam de fraudes educativas, ao serviço de um programa oculto de diminuição do défice que decidiu cortar os dedos para poderem ficar com os anéis.