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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

27.5.08

Esta espécie de infracapitalismo de Estado com que o Bloco Central restaura o pior do velho mercantilismo...


Hoje, no DN, há alguns pedaços de uma conversa que mantive com Paula Sá, sobre o interregno do PSD: "Diga-me qual vai ser o preço do barril de petróleo daqui a um ano e eu dir-lhe-ei qual será o melhor candidato para ganhar a liderança do PSD e defrontar o Governo de José Sócrates." Este repto retórico ao DN do professor José Adelino Maltez visa demonstrar que sem se saber a incidência da crise económica internacional é difícil escolher o candidato social-democrata que irá ao encontro das preocupações dos portugueses. "Depende do dramatismo com que a classe média sentir essa crise", que, na sua opinião, já fez o "primeiro- -ministro perceber que tudo aponta para que perca a maioria absoluta". Se a crise não atingir em cheio o bolso dessa classe média, José Adelino Maltez considera Manuela Ferreira Leite a melhor candidata para lhe roubar a maioria absoluta. "Afinal, o socratismo é um subcavaquismo..."Mas se as dificuldades económicas forem mais sérias, "nesse caso o PSD devia ter outro tipo de liderança, menos passadista, capaz de um rasgo de criatividade". Neste contexto, Pedro Passos Coelho e Pedro Santana Lopes teriam vantagem em relação a Ferreira Leite.


Por mais palavras, assinalei que esta tendência de todos mandarmos sentenças para o interior do PSD, sem dúvida, o partido com mais militantes em Portugal, revela o desrespeito que quase todos manifestam face à soberania dos militantes. A faceta socratista da governança, acirrando a ilusão de controlo social através da manipulação da engenharia social do "agenda setting" até faz sair aquela fuga de informação que colocava Manuela Ferreira Leite como a melhor candidata do PSD para o PS, porque assim levaria a que os descontentes do PS deixassem de votar no BE e do PCP!!!!


Quase faltava dizer que Manuela seria melhor ministra das finanças de Sócrates do que Teixeira dos Santos, no âmbito da estratégia "porreiro, pá", com a restauração do estado de graça entre Belém e São Bento, naquilo que Manuel Alegre poderá continuar a qualificar como socialismo de plástico feito por uma agência de comunicação. Coisa equivalente a dizermos que Paulo Portas torce por Santana Lopes, tendo em vista a eventual criação de um novo partido de direita com as suas quintarolas de PP e PSL e a eventual adesão de Manuel Monteiro. Porque, se assim fosse, qualquer histórico da resistência do partido fundado por Sá Carneiro teria que optar por Pedro Passos Coelho, numa espécie de Manuel Monteiro, revisto e acrescentado, mas sem a benção de Adriano Moreira contra Basílio Horta... Se assim fosse, até Sócrates poderia convidar Passos Coelho para a pasta da inovação e candidatar Santana aos Paços do Concelho de Lisboa num grande Bloco Central, face ao cerco do PCP e do BE.


De qualquer maneira, o cerco ao situacionismo pode vir a acirrar-se, com mais uma crise importada, equivalente às vacas magras que liquidaram o marcelismo por causa do primeiro choque petrolífero, acelerando a chegada do 25 de Abril de 1974. E talvez não chegue o "agenda setting" ou essa subtil forma de controlo social que resulta da difusão do crédito hipotecário, por causa da compra da casinha que faz dos portugueses servos da gleba bancária e, consequentemente, gente que teme os riscos da mudança e despreza a criatividade, dado que grande parte dos rendimentos vai direitinho para angústias dos juros, já sem a barateza que nos deu o euro e o Banco Central Europeu.


Gerou-se assim uma nova casta bancoburocrática, reforçada com as companhias das "golden share", bem representadas pela Galp e pela Edp, para onde os governos mandam alguns restos de certos prebendados pelo sistema, criando-se uma espécie de infracapitalismo de Estado, dentro da tradição do mercantilismo e do absolutismo e das novas formas de sociedade de corte, onde até ninguém repara que os mexias foram ministros do santanismo, dado que a face empresarial deste, santificada pelo dinheirinho, não tem o cheiro dos santaneiros da politiquice.


De qualquer maneira, a campanha do PSD, onde até tem brilhado Patinha Antão, revela como a politiqueirice atingiu um nível pouco recomendável à necessidade que os portugueses têm de criadores de sonhos, capazes da necessária mobilização cívica, coisa que nada tem a ver com estes sucedâneos de sebastianismo, em que se enreda o populismo, o tal que é tão hipócrita que até consegue encenar a própria autenticidade, fingindo que é verdade a própria mentira dos que não vivem como pensam e andam sempre a pensar como vão parecer que vivem. Como ontem dizia Alegre, falta muita poesia à política. Talvez porque os ex-revolucionários frustrados se terem convertido à mera faceta burocrática e estatística da democracia dos homens de sucesso, mas mantendo o ditame do velho criador da nossa esquerda revolucionária, para quem um bom revolucionário nunca poderia ser um humanista... Por isso é que continuaria a preferir o calvinismo.