Cavaco lá veta mais um diploma. O buraco do BPN é do tamanho de um oceano, mas os que dele receberam prebendas e ofícios continuam a dar-nos lições de moral, pessoal, religiosa e pública, sem qualquer espécie de vergonha. O coiso já está nacionalizado nos seus prejuízos, já são nossos os golpes que apenas alguns praticaram e ninguém repara que o banco público já teve que lá meter exactamente o dobro do que estava previsto por ocasião da nacionalização. O erário é elástico, quem paga é sempre o Zé e, depois, a culpa cabe aos liberais, porque o socialismo, a social-democracia e a democracia-cristã são um elixir mágico que nos dá o reino dos céus e a absolvição permanente, mesmo sem qualquer espécie de penitência. Peço desculpa por este grito de revolta que os fariseus da perecerística hão-de qualificar como inqualificável, porque não podem internar a liberdade de expressão num campo de concentração, embora possam usar o chicote do ostracismo.
Como se a atitude liberal significasse subscrevermos o discurso dos patrões, especialmente o discurso salazarento de certas forças vivas de sempre e dos variados grupos de pressão e de interesse que já não falam nos corredores parlamentares e ministeriais, mas noutros passos perdidos, bem mais altos, próximos da "inside information", desse "holding" dos "holdings", onde, carregando-se num botão, pode matar-se um qualquer mandarim, mesmo que seja na China. Em Portugal, se sempre existiu uma economia privada desde o devorismo, pintada de liberalismo a retalho, e os situacionismos nunca deixaram que florescesse uma economia de mercado, de concorrência, de sociedade aberta e de não condicionamento proteccionista. Por outras palavras, nem sequer alguma vez admitiram a ética individualista do capitalismo que continuo a defender. Os representativos patrões desta pequena casa lusitana, aqueles que, em vez da economia, fazem os jogos típicos dos donos do poder, com muitos feitores e capatazes, semeados na classe política e na engenharia da parecerística e das avenças, que enreda os intelectuais, são mais herdeiros dos fidalgotes que fizeram, da Inquisição, um tribunal de Estado e de classe, que dos que queriam introduzir a burguesia e o capitalismo em Portugal, como eram os chamados cristãos novos.
Mais uma vez repetem a táctica. A de ocuparem o púlpito daquela demagogia que passa pelos "mass media", e que já não é controlada pela deontologia dos jornalistas. E talvez consigam manipular o mesmo povo, o tal que pode escolher o caminho para o desastre, porque os barões capitaleiros, das várias capitais que temos, se sentem como peixe na água pantanosa, neste lodaçal da desinstitucionalização, agora que os meninos ricos pintadores de paredes já são ministros e líderes partidários. Não dos signos ideológicos esquerdistas e revolucionários de outrora, mas desse grande caracol do imobilismo ideológico, a que damos o nome de socialismo democrático, social-democracia e democracia cristã, o qual se reduz à baba do mero intervencionismo estadual, feito dinheiro dos contribuintes, por mais que se esforcem os bem intencionados, ainda maioritários na classe política e que não há meio de exercerem o dever de revolta.
Os donos do poder, habituados ao parecer comprado, à avença feudal e a outros requintes da velha fidalguia, que deixava o trabalho sujo aos inquisidores, hão-de, dentro de pouco tempo, lavar as mãos como Pilatos e continuar a dizer que a culpa morreu solteira, lado a lado com os muitos idiotas úteis. Apenas confirmo Beaumarchais: a culpa da escravatura é dos escravos que não assumem a necessária revolta de escravos, a única que pode fazer cessar a presente servidão voluntária. Basta fazer as contas e pedir a um qualquer fiscalista que nos demonstre como quem paga impostos em Portugal é o proletariado e a classe média baixa que não sabe onde ficam as ilhas Caimão, onde costuma haver furacões que aqui não chegam por causa da corrente do golfo do "mainstream". Ao que consta, o Zé Povinho, em forma de louça, está prestes a falir, por causa do "magalhães" indiano, que não vai chamar-se "vasco da gama", mas que sai ao preço desta chuva de invernia que já não se confunde com o molha-tolos do costume...
PS: Dizia-me ontem um desses belos indisciplinadores, dos que querem pensar pela sua própria cabeça, depois de ler a sondagem da Católica sobre os efeitos do "Freeport", que a Manela ainda pode sair primeiro-ministro, no fim do ano. Bastaria que fosse para um qualquer mosteiro budista no Tibete em retiro espiritual, assim gerindo o silêncio até às eleições. Pelo menos, ela sabe de ciência fiscal e pode introduzir as necessárias reformas que têm sido aventadas pelo Medina Carreira. Acabar com a gorda interpretativa das isenções e dos despachos casuísticos dos perdões, nomeadamente aos poderosos, a quem se esqueceram de cobrar o IVA...
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