a Sobre o tempo que passa: A ruinosa conspiração de avós e netos, com amnistias decretinas à mistura

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

1.6.09

A ruinosa conspiração de avós e netos, com amnistias decretinas à mistura


Os engenheiros de campanha, desde os fabricantes das miudezas do "agenda setting" aos angariadores de figurantes para as excursões dos comícios, passando pelos falsos catedráticos em recrutamento cívico e pelos eméritos salazarentos em golpadas de salão, todos estes especialistas em casca de árvore, ao ritmo da cansativa música celestial do vira-o-disco-e-toca-o-mesmo, por mais que promovam conspirações de avós e netos entre a gerontocracia dos coloquiantes, em seminarismo de verão e sermões de fim de semana da televisão pública, e a verdura teórica dos jotas da tradução em calão, não conseguem disfarçar que o vazio de causas ocupou os interstícios daquilo a que chamamos campanha eleitoral.


Quando a laranjada caiu na esparrela do comício à moda do Minho, obrigando Manela a botar faladura de palanque barcelense, um quarto de hora antes da meia noite, não foi o galo fêmea que cantarolou, mas antes a falta de coerência de uma líder que, mais uma vez, se manifestou, cedendo à pressão dos seus campanheiros, carimbados por um falso profissionalismo. Quando a rectaguarda "eme-erre-pê-pê" do cunhalismo arrependido, cheio de ministros despedidos, a tentarem copiar os emplastros que espreitam atrás do voluntarismo retórico de Rangel, atingiu o seu clímax de anedótico à espera da Elisa, no passeio atlântico de Matosinhos, todos nos questionámos sobre a ausência de Narciso Miranda, Manuel Seabra e Rosa Mota, talvez noutra pré-campanha, para que não nos lembremos do drama de outras cenas no mercado leixonense.


Nem a retórica do partir os dentes à reacção, com que Jerónimo agride os chicos espertos da direita que andam à apelar à abstenção, nos comoveu, porque a visita de D. Ilda ao Cabeção, à procura de emigrantes alentejanos, foi equivalente aos beijinhos de Nuno Melo a uma centenária senhora, num lar de cuidados paliativos, ou às espetadas dos madeirenses da UDP, para que o outro Portas desancasse no Berardo e no Banif, porque fecharam um hotel de cinco estrelas para os investidores no "off shore". Por outras palavras, a nossa querida classe política das feiras e dos comícios mostra-se totalmente incapaz de compreender o todo do sistema em que se insere, demonstrando à saciedade como estão a falhar as canalizações representativas que a ligavam ao povão.


Quando agora peroram sobre a roubalheira bancária que atingiu o irmão-inimigo do partido feito à sua imagem e semelhança, atirando pedradas às vidraças do vizinho, é natural que, ao chegarem a casa, encontrem as suas quebradas. Isto é, com tantas bombas de fragmentação, todos têm o corpo de campanha cheio de estilhaços, mesmo que as glosas sobre o BPN tenham feito esquecer o Freeport e quase amnistiado o BCP e o BPP, ao mesmo tempo que lançaram alguns dejectos sobre o Banco de Portugal e a Presidência da República, enquanto se continua a lançar lixo sobre ambas as magistraturas.


A campanha que agora atinge o seu auge apenas confirmou que o aparelho de poder do principado continua a asfixiar a comunidade, ou república, confirmando-se a falta de autonomia da sociedade civil e continuando-se este processo de desinstitucionalização em curso. Veja-se o caso dos professores, onde os interesses de propaganda de Sócrates preferiram a amnutenção de uma ministra e dos seus ajudantes, atirando os docentes para o desespero de cem mil manifestantes na rua, agora reduzidos aos que querem obedecer aos discursos de Mário Nogueira, já sem a autenticidade da primeira descida do Marquês para o Terreiro do Paço.


Mas o que aconteceu aos professores, quase se repetiu com magistrados, polícias, médicos, farmacêuticos e todos os outros grupos que escapavam às garras do hierarquismo da administração directa do Estado e que não liam pela cartilha do pensamento único, expresso por Augusto Santos Silva ou Pedro Silva Pereira, agora revisto e acrescentado por Vital Moreira e Ana Gomes, ou contraposto pelo oposicionismo verboso de Rangel e dos seus repetidores. Os resultados estão à vista, com o crescimento dos apoios sociológicos ao Bloco de Esquerda e à continuidade do cunhalismo, transformando a república dos portugueses num caso "sui generis" de contraciclo na União Europeia, onde a jangada de pedra está a rumar cada vez mais para o estrondo islandês, dado que os nossos glaciares assentam cada vez na subsidiodependência de um voto marcado por uma visita a uma unidade de cuidados continuados de um "Welfare State" transformado em conspiração de avós e netos, entre a economia salazarenta e engenharia subsidiocrática do socratismo, à procura do primeiro "Magalhães" que nos iluda e obtenha a concessão perpétua pela autarquia de mais um terreno gratuito para o alargamento da fabriqueta...