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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

12.1.11

Viagens delirantes à roda do Vanuatu, esta nossa real república dos parvónios...

1
Vou partir amanhã para Vanuatu. Para a ilha do Espírito Santo. Vou à procura do eborense Pedro Fernandes Queirós (1563-1615) que lhe deu nome (Terra Austrália do Espírito Santo), enganando-se. Se eu soubesse alguma coisa da poesia australiana, comentaria James Phillip McAuley (1917 -1976) e o seu livro "Captain Quiros" (Sydney, Angus & Robertson, 1964).


2
Fico-me pela leitura de O. H. K. Spate, "Luso-Australia: In Maps and Verse", separata da "Revista da Universidade de Coimbra", XXVII, ano de 1979, pp. 219-237. Nisto de mapas e versos, andamos bem esquecidos. Porque os únicos construtores em Portugal sempre foram os idealistas, até este Queirós com a sua Nova Jerusalém... que fez "Os Lusíadas" lá do outro lado da esfera...


3
Onde sou, não estou, onde estou não sou. Mas vou. Na primeira cena da campanha presidencial, um dos reverendos, em missionologia, desembarca numa das ilhas de Vanuatu. Apenas estou a fingir que fujo da real república da parvónia... A tal onde há récitas suburbanas para saudar venerandos presidentes-reis que nem são coisa com coisa...No dia seguinte, já na imagem imediata, é vítima de horroroso massacre. Consta que foi ao fundo. Não teria estudado adequada antropologia melanésia.



4
Já cheguei. E lá em cima deixo o mapa. Já arranjei ligação para assistir ao leilão das dez e meia desta globalização de casino.


5
Não se espantem com a rapidez. Estava em Larantuka e, graças a cunha de um dos gestores de certo casino instalado na Coreia do Norte, aproveitei um lugar de galinheiro no jacto privado de um destes especuladores dos mercados internacionais...: http://www.offshore-professional.com/de/index.html




6
Segui pela marginal fora, à procura de porto seguro. E fiz as contas. Aqui, presidente da república ganha 4 000 dólares por mês. O reitor da universidade, apenas 400 dólares. Mas o empregado de segurança de uma ONG que anda recolher folclore, já ronda os 10 000 dólares.


7
Noventa por cento das receitas desta paradisíaca república vem das receitas do petróleo a haver, depois das pesquisas feitas ao largo da Berlenga pequena.




8
Tentei contactar com os assessores cimeiros de uma das campanhas presidenciais, mas logo me barraram o caminho com uma placa sobre gestão de silêncios. O outro candidato tinha ido pescar para o pantanal. Procurei, então, o terceiro, o caçador.


9
Finalmente, com a ajuda de uma carrinha do FMI, e acompanhado por um guia da principal "offshore" cá da ilha, fui ao comício do candidato alternativo.O calor da paixão contagiou-nos.


10
Teodora diz que devemos pedir ajuda. Já! Qual Senhora de Fátima, qual carapuça! Pena de morte para a heresia, mesmo que a sanção seja suspensa..


11
Felizmente, já não há canibais...


12
Guerra Junqueiro e Guilherme de Azevedo já tinham antecipado esta nossa querida real república da parvónia...pena não termos a mesma língua afiada...


13
‎"A minha questão é esta: pretendo fundar um banco que se deve intitular: – Sociedade de Agricultura do Pinhal da Azambuja, – destinado a fomentar a pobreza do país, a ruína dos accionistas e a prosperidade dos directores. O nosso programa é simples: levantar o mais que puder e pagar o menos que for possível: ao cabo de ano e meio fugimos e os accionistas são metidos na cadeia." (Viagem à Roda da Parvónia)


14
Acabei de ser ameaçado pelo representante local da Sociedade de Agricultura do Pinhal da Azambuja. Diz que atentei contra a capacidade de exportação da economia nacional.


15
O advogado da SAPA, antigo consultor de um dos nossos primeiros, já me processou no TPI e na FIFA, por me ter assumido como porta-voz do Abílio de Freixo de Espada à Cinta, um catastrofista, autor do "Finis Patriae"...


16
A delegação local dos Supermercados Wong, de Singapura, explicou-me como já compraram milhões da nossa dívida soberana. Sabe português porque fez estágio de tríades no Casino da Ilha da Taipa...


17
O assessor económico do dono do Casino do Monte Tabwemasan cá da terra acaba de elogiar o nosso Simplex. Apenas critica a morosidade do sistema processual de cobrarmos dívidas, por causa dos robalos...


18
A procura foi superior à oferta, mas os juros não se alteraram muito desde o último leilão. Passámos no teste, nosso primeiro já pode viajar para o Qatar, mas a barca ainda está atracada, enferrujadamente, aqui no Vanuatu.


19
Mal as notícias do leilão chegaram, logo foi organizada manifestação espontaneamente ordenada pelo governador civil de Kokuku.


20
Estamos melhores cerca de 0,01%. Logo, o que não é pior é melhor, como diria Monsieur de La Palisse, um quarto de hora antes de ficar pior de vez


21
Num jantar realizado aqui no Vanuatu, no alto do morro, houve quem sonhasse numa segunda volta. Todos os aborígenes, lá, daqui, de seta em riste, querem resistir e espetar a dita no dorso do tabu, gerindo o silêncio da revolta.


22
Passámos no teste dos mercados, os mercados são bons e o FMI é mau, apesar de dirigido por um camarada socialista...Irra! Já chega de propaganda do ministerialismo situacionista sobre as asneiras, da esquerda, da direita e do meio, essas que todos já estamos a pagar! “Quousque tandem abutere, Catilina, patientia nostra?"