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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

19.7.07

A fala forte apenas disfarça o argumento fraco da habitual esquizofrenia do Portugal dos pequeninos com a mania das grandezas


O ministro da consciência tranquila e da propaganda veio hoje confirmar à Lusa que sempre houve tiranetes na administração pública, isto é, veio hoje reconhecer que, sob o respectivo governo, continuam os tiranetes. Por outras palavras, face ao continuado laxismo do Bloco Central, muitos têm que confundir o exercício do poder com pequenos e grandes tiques autoritários, onde a fala forte apenas disfarça o argumento fraco da habitual esquizofrenia do Portugal dos pequeninos com a mania das grandezas.


Onde o exagero dos sinais exteriores de poderio não consegue disfarçar o vazio de autoridade. Onde o hábito não faz o monge. Até porque os "teres" do que parece e do que aparece acabam por corresponder a um "não ser". Porque o Estado a que chegámos não passa de um gigante com pés de barro, a que costumo dar o nome de estadão.


Basta notar a entrevista televisiva com que Marques Mendes, outro ex-ministro da propaganda e do alinhamento dos telejornais, tentou responder ao gaiense Menezes, demonstrando como está para o PSD como Ferro Rodrigues esteve para o PS. Onde apenas se espera que o actual supremo revisor de contas acabe por fazer-lhe o vazio com que o antigo notário do regime despediu o actual embaixador na OCDE, na fase não-Pilatos do respectivo mandato belenense.


Já a viagem pelos micro-autoritarismos sub-estatais continua. Ainda ontem ouvia ao vivo, e em directo, um discurso sobre o conceito de Estado de Direito de um ex-alto responsável pela reforma do estadão socialista, para quem a administração pública apenas poderia protestar pelo recurso aos tribunais. Isto é, não reparava que a justiça sempre foi superior ao direito e este, superior à lei. E que mesmo uma ditadura, com tortura, pode obedecer ao princípio da legalidade, como acontecia com os pides no salazarismo.


Julgo que precisamos muito de "glasnot" nesta falta de paredes de vidro de muitos segmentos de uma administração pública, onde a "perestroika" está cheia da velha mentalidade concentracionária. Os cursos rápidos de pluralismo e de Estado de Direito seriam benvindos, para extirparmos a subcultura de estadão caciquista que nos enregela, nesta "second life", plena de cangalheiros com música celestial.