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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

12.7.07

Os patinhos amarelos que estão a dar à costa...


Quando o situacionismo se enreda nas teias dos chamados tiques autoritários é natural que reaja alguma esquizofrenia oposicionista que acaba por cair na espiral da teoria da conspiração, onde não tardará que direitistas queiram comer comunistas ao pequeno-almoço, antes que os comunistas ameacem partir os dentes à reacção, para que bispos temam conspirações carbonárias, inquisidores continuem a caçar bruxas e advogados passem de arrazoadores de boas causas a argumentistas de subfilmes policiais da série Intendente.
Não faltarão explicações de espiões desempregados sobre hidras congreganistas e anticongreganistas, onde só há mafiosos, pedófilos, cabalas e papos cheios de maçons, opus dei, patrões capitalistas de faca na liga, agentes de potências estrangeiras, judeus, estrangeiros, fascistas e comunas.


Por isso, prefiro ler no jornal Público que estávamos no ano de 1992 quando um grupo de 29 mil patos amarelos, tartarugas azuis, sapos verdes e castores vermelhos de borracha se libertaram do navio de carga que os levava para os EUA, deixando-os à deriva a nadar livremente nas águas oceânicas. Agora, 15 anos após o naufrágio, diz-se que irão aparecer na costa inglesa, e, quem sabe, na portuguesa também.


É natural que esta demagogia extremista, à esquerda e à direita, leve à inevitável quebra de confiança pública, só porque o poder estabelecido entrou em desnorte, porque lhe tocaram num qualquer calcanhar de Aquiles, chame-se Universidade Independente, Universidade Atlântica, sobreiros ou submarinos. Assim, o feitiço voltou-se agora contra o feiticeiro e os que atiraram pedradas contra as paredes de vidro, chegaram a casa e acharam as suas janelas quebradas.
Não me parece que um ex-director de um semanário semeador do populismo persecutório possa agora ir ao palácio de Belém pedir desculpa pelas parangonas de outrora e que todos os outros líderes da oposição se recordem do que sucedeu a Ferro Rodrigues. Por outras palavras, os perturbadores das águas pantanosas desta economia privada, que não é economia de mercado mas oceano de tabus, e deste estadão de origens absolutistas, que não assente numa cultura de Estado de Direito, abriram profundas fissuras na caixa negra de um sistema que entrou em disfunção.
Os patinhos amarelos estão agora a dar à costa. Não tarda que Marques Mendes faça uma conferência de imprensa para exigir a Sócrates o prometido despacho sobre o eventual encerramento da Universidade Independente, para que Isaltino de Morais responda com uma auditoria à sua Universidade da Fábrica da Pólvora, onde um dos principais accionistas era precisamente Joe Berardo, nesse ensaio que Barcarena fez dos modelos de conselhos gerais das universidades.
Não tarda que recomece o julgamento do processo Casa Pia ou que entre em assobio o processo do Apito Dourado, agora que Correia dos Campos, aos costumes, vá dizendo nada e que os charruamentos esperem vez para entrarem no mediático de outros julgamentos, onde Balbino Caldeira está prestes a pedir uma justiça que talvez não se confunda com os delírios do blogue do respectivo advogado, inspirado no programa "simplex" da habitual caça às bruxas. Os patinhos amarelos continuam a dar à costa. E a culpa está toda na fábrica dos moldes que transformaram as nossas elites numa gigantesca contrafacção que qualquer rusga da ASAE apreenderia...
PS3 Este postal foi sujeito a corrector ortográfico. Teve cerca de dez riscos vermelhos. Um, com um flagrante erro ortográfico que já corrigi. Mas cerca de nove vocábulos parecem não constar do dicionário vigente, entrando na categoria de delírio neologista. Obrigado, senhor revisor médico. Aqui ainda á cuidados no texto, ao contrário do que sucede na jornalada de Vossa Senhoria. Faz-me lembrar a censura eclesiástica que tive numa recensão de conhecida revista congreganista, quando me apontaram vários erros teológicos, para depois me esmagarem com uma errada citação latina, sem repararem que era um apud originário de São Tomás de Aquino, divulgado por um conhecido autor fascista a que o mesmo inquisidor congreganista tecia loas. Evidentemente que um colega meu, fascista e tudo, já tinha metido nos cacifos de todos os restantes colegas a minha insapiência latinória. Ri-me e continuei a fazer citações latinas, aprendidas com o professor bobibu, o saudoso José Nunes de Figueiredo.