a Sobre o tempo que passa: Por mim, apenas repito o gesto do Zé Povinho

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

10.1.08

Por mim, apenas repito o gesto do Zé Povinho


Ontem, o nosso dia de confirmação do conceito europeu dominante entre os donos do poder deste situacionismo. A coisa é um "dossier" de reservado direito de admissão que tem medo da democracia directa e que, em vez dos povos, prefere o oligopólio das multinacionais partidárias do PPE e do PSE.


Logo, as nossas secções nacionais, dependentes do programa comum e da estratégia a que se submeteram, cumpriram as ordens. Aqui não se aplica o projecto de João das Regras apresentado nas Cortes de Coimbra de 1385, dito QOT, ou quod omnis tangit, isto é, o que a todos diz respeito, por todos deve ser decidido.


Segundo, também por cá não vigora a ideia básica da democracia que é o respeito pela palavra dada. Essa coisa dos pacta sunt servanda apenas se aplica aos tratados internacionais, mas já não às promessas eleitorais internas e aos programas de governo. Vivemos em regime de primado da Razão do Super-Estado do porreiro, pá. E tanto o parlamento como o governo, de acordo com a presente interpretação da separação de poderes, apenas são camarais caixas de ressonância das deliberações dos infradirectórios partidários que executam o rolo unidimensionalizador dos superdirectórios partidários que assaltaram o projecto europeu.


Vale-nos que os Gatos Fedorentos mudaram de camisola, em nome da mesma facturação que movimenta Santos Ferreira e Armando Vara. E pode ler-se que o CDS-PP conta com 45.239 filiados nos ficheiros do partido, mas um processo extraordinário de actualização de ficheiros ainda em curso confirmou 6.232, o número indicado ao Tribunal Constitucional para a verificação do mínimo legal de militantes. Tal como a fundadora do Partido da Nova Democracia Susana Barbosa anunciou ontem a sua desfiliação do PND e a constituição de uma nova formação política, o Partido da Liberdade.


Por outras palavras, se mais mil militantes do que o limite ataturquiano já deram direito a ministros e a administradores da Caixa Geral de Depósitos, bem como ao remanescente da compra de submarinos, no caso do PP, e muito menos militantes do que isso, no caso do MPT e do PPM, permitiram deputados, através de uma coligação com o Partido de Santana Lopes, podemos, sem exagero aplicar a mesma regra da proporcionalidade ao PS e ao PSD, concluindo que a maioria dos juízes do Fiscal Constitucional foram nomeados por uma oligarquia ultraminoritária.

Por outras palavras, com tanta Europa de "off side" e tanta banca de "off shore", vale mais relermos os textos de Ostrogorski e de Michel sobre a infância da partidocracia e do sufrágio universal. Quanto mais massificação no Estado Espectáculo, mais organização oligárquica nos aparelhos controladores do Estado-Aparelho. Porque a república, ou comunidade, prefere ver os Gato Fedorento e reler as aventuras da ASAE na aplicação da lei antitabágica. Por mim, apenas repito o gesto do Zé Povinho, louvando o poeta Manuel Alegre.