a Sobre o tempo que passa: O Ermitão posto a tormento Confessou não Ser El Rey Dom Sebastiam nem o queria Ser e que So com as Suas armas queria Vencer Lisboa pondo-a em Liberdad

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

1.6.08

O Ermitão posto a tormento Confessou não Ser El Rey Dom Sebastiam nem o queria Ser e que So com as Suas armas queria Vencer Lisboa pondo-a em Liberdad



No próprio dia da vitória de Manuela Ferreira Leite, fui ao sítio onde a terra acaba e o mar começa e assim diante do oceano, recordei o ermitão Mateus Álvares, de Vila Praia, onde tem nome de rua. Reli o manuscrito "Memorial de Ministros", conservado na Biblioteca Nacional, pensei no ano de 1585 e ficaram-me as palavras do meu vizinho eterno, de S. Julião: o Ermitão posto a tormento Confessou não Ser El Rey Dom Sebastiam nem o queria Ser; e que So com as Suas armas queria Vencer Lisboa pondo-a em Liberdade, Como pretendia




Vários magistrados que foram enviados a prender o ermitão: Gaspar Pereira do Lago natural da Villa de Vianna da Provincia de Entre Douro e Minho de familia muito nobre e com boa descendencia como dis a Corografia Portugueza no 3.º tomo a fl. 617. Foi Ministro de grande reputaçam. Dezembargador na Caza da Supplicaçam e nella de Aggravos, Corregedor do Crime da corte que hindo a villa da Eryceira prender o Eremitão que se fingiu ser El Rey D. Sebastiam, foi morto Violentamente pelos sequazes delle que associados em grande partida querião fazer as partes ao dito fingido Rey por se hallucinarem que elle o verdadeiro Monarcha.




Era este individuo de natureza hum Gonçalo Alvres natural da Ilha terceira, filho de hum conteiro de baixa esfera, o qual fora Noviço em hum convento de Religiosos Descalços para o ministerio de Leigo professo: veyo para a villa de obidos Sendo expulso do Convento e como quer que neste intermedio tivesse socedido o fatal acontecimento da perda ou da morte do Rey D. Sebastiam reynando já em Portugal Filippe 1.º o Prudente intentou o referido eremitão Arrogarse verdadeiro Rey na viva imajem do que antecedentemente se tinha perdido.




Juntou hum sequito de oito centos de pessoas athe mil que por seu verdadeiro Rey o veneravão e ajudado de hum Lavrador veio chamado Pedro Affonso, que tinha por si todos os moradores da Eryceira, Carvoeira e Mafra, e outros muitos lugares mandou huma Carta ao Archiduque, que governava o Reyno por hum filho de Antonio Simoéns Homem rico que com coração o seguia, a qual continha que era tempo de se abrirem os olhos e que logo despejasse o Real Palacio; e outras mais expressoéns semelhantes ao discurso de tão ridiculas figuras e dando este Emissario a Carta ao Archiduque, foi prezo porem Logo o soltarão; motivo porque se acreditou por mais verdadeiro o socesso que tudo foi simulado e fingido, dando o dito Eremitão fundamento para maiores concursos, que o seguião, nomeando officiaes, dando titulos e lavrando sellos. Para se aplacar hum tão sediciozo motim contra Deos, contra o Rey verdadeiro e contra todas as gentes, Ordenou o governador do Reyno mandar justiças contra os tumultuarios.




Foi o primeiro nomeado o Juiz de fora da Villa de Torres Vedras com os seus officiaes aos quaes todos matarão os sediciosos com rigorosos tormentos. E como hião crescendo os abismos e absurdos foi precizo hir Ministro mais condecorado, qual foi Gaspar Pereira do Lago com justiças mais dobradas, o qual corregedor foi victima da sua gloria sendo morto as punhaladas e hum seu filho e sobrinho, que o acompanharão na jornada e na morte. [...]



Antonio da Fonseca Foi ministro de grande Circunspecção, e de grande respeito, e nome. Dezembargador, e Corregedor do Crime da Corte, que prendeo na Eryceira o Ermitão, que Se fingia Ser El Rey Dom Sebastiam – Despois que matarão ao Corregedor do Crime da Corte Gaspar Pereira do Lago os Confederados do dito Ermitão, que o seguião, na Villa da Eryceira, Como Se conta no Lugar deste Ministro, foi mandado Antonio da Fonseca a esta deligencia, e juntando 400 Castelhanos Com o Capitão Calderón entrarão como em porfiada batalha, e não Conseguirão mais do que as mortes de algúns Sediciosos. Por fim de tudo foi por Sagacidade prezo o dito Ermitão, que lhe armou hum Cavalhero Portuguez chamado Balthazar de Sá. Despois desta principal prizão, forão prendendo muitos, que todos forão Castigados em patibulo com mãos cortadas, e os de menos Culpa, Sentenciados a galez. o Ermitão posto a tormento Confessou não Ser El Rey Dom Sebastiam nem o queria Ser; e que So com as Suas armas queria Vencer Lisboa pondo-a em Liberdade, Como pretendia [...]