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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

1.6.08

O passado e o presente esmagam as saudades de futuro.


A direita portuguesa tem uma nova esperança, expressa por alguém que nunca disse nem gosta de ser de direita. Sócrates tem agora uma rival que não pode ser driblada pelo argumentário com que marcava golos a Paulo Portas e Santana Lopes. Chegaram novos tempos. De uma simpática avó, militante católica, filiada no PSD desde 1985, antiga ministra da educação de Cavaco Silva, de 1993 a 1995, e antiga ministra das finanças de Durão Barroso, de 2002 a 2004. Sportinguista e reformada da função pública, administradora não-executiva do Banco Santander, mas nunca objecto das críticas que marcaram Jorge Coelho à Mota-Engil. Até parece sincera quando manifesta preocupações sociais, sem cair na tentação populista e, sem sombra de dúvida, sabe bem mais de contabilidade pública do que o ministro Silva Pereira, podendo sitiar o socratismo, sobretudo no falhanço da reforma do Estado, a tal oportunidade perdida que agora cheira a bombas de gasolina e a peixe fresco em greve.


Voltou outro heterónimo de um ambivalente PSD, feito espelho da nação. Contraditório, paradoxal, umas vezes, à esquerda da esquerda, na questão social, segundo o ritmo da perspectiva catolaica, agora que o PS está desertificado de JUCs, outras vezes, à direita da direita, aliado ao "cluster" da função pública. Umas vezes, radical, outras, ordeiro. Sobretudo, neste tempo de transição, de uma Europa que já não é de Kohl, Delors e Cavaco, mas de Sarkosy e de Berlusconi, com vinte por cento dos portugueses a terem simpatia pelos comunistas e pela extrema-esquerda.


O nosso situacionismo, onde volta a dominar o conflito entre o partido dos funcionários e o partido dos fidalgos, como nas rixas de Campo de Ourique de 1803, não repara que falta um adequado partido dos trabalhadores e dos criadores de riqueza, pela mão de obra, pela cabecinha ou pela organização empresarial. Os defensores da feudalidade ou da mera tecnocracia estadual não deixam espaço para os sonhadores do novo reino e do melhor regime, nem que seja o império do espírito, do poder dos sem poder, para podermos coroar as criancinhas. Agostinho da Silva nunca percebeu nada de finanças públicas. O passado e o presente esmagam as saudades de futuro.

PS: Sobre o PSD já gastei as palavras todas na passada sexta-feira, na TSF e na SIC-N, bem como hoje no JN e no DE.