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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

23.7.08

Aqui, em muitas conversas nocturnas com as estrelas e a passarada


Têm estranhado alguns leitores a minha ausência deste espaço. Coincidências. Primeiro, orais e orais da bolonhesa. Segundo, uma, duas, três, quatro intervenções em júris exteriores, todos das duas tradicionais escolas de direito, com trabalho de casa e idas à "alma mater" conimbricense e lisbonense, entre o direito do século XXI e as teorias da guerra justa. Terceiro, as limpezas do matagal no meu Valbom dos Gaviões, sobretudo na biblioteca da papelada e em conversas nocturnas com as estrelas e a passarada. Quarto, na sexta-feira, estarei aqui, entre JSD, JS, monárquicos e republicanos que querem pensar a política. Aliás, entre leituras, releituras e pareceres, optei pela tradicional escrita manuscrita e deixei o computador a meia centena de quilómetros.


Mesmo assim, ainda fiz comentários para o DN de domingo e para o Diabo de ontem, onde observei que as habituais manobras politiqueiras do eleitoralismo da governança são tradicionais remedios dos curandeiros que pela magia da propaganda transformam a banha da cobra em reformas estruturais. Acontece que houve uma alteração anormal das circunstancias exigindo uma intervenção de salvação publica e de consenso de união sagrada que até já vai além de um governo bloco central, de inspiração presidencial. Por outras palavras, precisamos de voltar a escrever um novo contrato social que não seja um mero pacto de sujeição, ou de governo, mas antes um mais vasto pacto de união ou de associação, ou “new deal“. Tirar o PS para entrar o PSD é apenas mudarmos de placebo...


Quem anda mergulhado em jusfilosofices não pode interessar-se em demasia com as brincadeiras dos tiranos de Siracusa, mesmo que eles nos façam consultas. Não recebi avença dos ditos e daqui a bocado vou marchar para Coimbra outra vez. Não tardarei a voltar a Valbom dos Gaviões, para remexer na muita papelada que lá tenho. Até encontrei um douto projecto de dissertação sobre a administração financeira da Idade Média que constituía um esboço de um projectada dissertação de doutoramento em história do direito que, felizmente, abandonei.


Qualquer dia pegarei em mim e transformarei o trabalho em formato digital, para eventual publicação com pseudónimo, só para me convencer que vale a pena continuar a dar aulas de história da administração pública, nestes tempos de regresso a formas pré-estaduais de administração dita pública, mas efectivamente privatizada no mau sentido dos sucedâneos do lucro e da endogamia, onde a anarquia ordenada do neofeudalismo é mesmo o neofeudalismo da desordem bem organizada, para recordar o título do primeiro artigo de intervenção cívica num jornal clandestino dos velhos tempos pré-abrileiros. É que ao contrário de todos os outros que agora são políticos profissionais, eu sou capaz de publicar todos, mesmo todos, os artigos que escrevi e publiquei antes dos vinte anos, porque, graças a Deus, ou a Mundo, sempre fui herético e já por duas vezes me tentaram queimar vivo, uma com expulsão da Universidade, efectivada quando era estudante, outra com assassinato moral, em efectivação e com o mesmo fim. Julgo que vou resistir, nem que seja no exílio, porque os executantes são os mesmos torquemadas de cores diversas, mas com as mesmas garras da vindicta oriundas dos mesmos corpos mumificados em éter, tirado do caixote de lixo da história com as suas lutas de invejas.