A verdadeira mãe da república do sol nascente é a Justiça. Porque foi pelo Direito que os timorenses conseguiram vencer a força. Por outras palavras, a independência conquistada é o resultado da aplicação dos princípios do Estado de Direito universal, tal como delineado por Kant em 1795, no seu folheto dito sobre a paz perpétua e que alguns ainda não conseguem vislumbrar como projecto de protecção dos mais fracos contra a violência dos mais fortes que querem ser potências. Por outras palavras, só pelo Direito podemos enfrentar a lei da selva dos Estados-Lobos-dos-Estados e evitar que, neste oceano da globalização, os peixes grandes comam os pequenos.
Não diremos, como alguns nostálgicos do socialismo estatista, que a presente crise exige mais regulação leviatânica. Diremos, como liberal que continuamos a ser, que a crise desta anarquia predadora precisa de um Estado de Direito universal, que ela precisa não de uma federação de potências estatizantes, com o consequente facto da hierarquia das forças, mas de uma república universal, que, segundo Kant e Arendt, sempre foi o exacto contrário do Estado universal. Só assim nos livraremos da presente "animal farm", onde os Estados são todos iguais, mas há alguns desses animais que são mais iguais do que outros, promovendo um neofeudalismo nesta anarquia ordenada, com a consequente governança sem governo de uma pilotagem automática a que chamam globalização.
Mesmo as boas intenções onusianas de governança global podem cair na teia de uma intrincada burocracia, desse reino do ninguém onde a culpa costuma morrer sempre solteira, e assumir a imagem de uma vasta rede de aparelhos que se instala, como fortaleza exterior, num qualquer território, com as suas tendas de ar condicionado semeando, pelos pretensos desertos do vazio de política, a cartilha do "nation building" e do "state building". Porque se não atenderem às raízes das identidades dos vários povos, tais aparelhos podem assumir uma feição neocolonialista, mesmo que assumam a bandeira do anticolonialismo. Já conheci alguns destes agentes lá pelas Lisboas, sempre em turismo de comissão em comissão, vendendo um qualquer subproduto ianque de exportação, e, por cá, apenas posso fazer as observações permitidas pelas cláusulas do meu contrato de agente de cooperação do Estado português, coisa que não me impede a liberdade académica, o universalismo e até um mínimo de patriotismo científico.
Apenas assinalo que, por cá há muitos amadores desse ensaísmo de certos conceitos abstractos, assentes nos tais "compounds" e que raramente ousam colocar os pés no tal caminho que se faz caminhando e onde é preciso dar tempo ao tempo. Não há boa ideia de república universal que resista a sacristães, sargentos e cipaios verbeteiros. Colonialismo não é apenas o chicote de capataz, mas também o engraxar das botarras do feitor, com alguns intelectuais caindo da tripeça, numa qualquer escola de passarinhos, que se julgam importantes só porque têm mobília de pau preto e secretários a quem ditam actas que ninguém vai ler. Há pesos mortos de atavismos plurisseculares, marcados pelo regime dos irmãos inimigos que continuam a asfixiar muitos sonhos.
Por mim, prefiro ir além do saber do fazer e do próprio saber-agir e continuar a procurar o saber pelo saber da velha Sofia, com muita Prudência e imensa Arte, ou Técnica. Há sempre o "consenso dos que pensam de forma racional e justa". Porque o homem tende para o infinito sempre que se descobre finito e sabe que a liberdade não nasce da certeza, mas da incerteza. Por isso, ontem mesmo, lancei o primeiro blogue de turma, aqui na UNTL, dito "pensar direito".
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