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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

6.10.08

De mal com os jacobinos, por amor do rei, de mal com os neomonárquicos, por amor da república...


Pediram-me que fosse ao programa da Paula Moura Pinheiro, analisar, com serenidade, o comemorativismo do cinco de Outubro. Não se tratava de um comício de neomonárquicos contra neojacobinos, utilizando dezasseis anos de sofrimento histórico, para literatura de justificação de posições políticas que tomamos, quase cem anos depois, mas de um exercício académico, onde o Fernando Rosas não era o deputado do Bloco de Esquerda e eu, um seu adversário. E dialogámos, porque, para haver diálogo, há que ter lugares comuns. E encontrámo-los. E ainda bem. Logo, antes de o fazer já o sabia. Iria ficar de mal com os jacobinos por ser manuelino e, de mal com os neomonárquicos, por ser um republicano monárquico, adepto do regime misto.

Quando acentuei o patriotismo, como marca estruturante da república, apenas traduzi aquilo que é fundacional na minha concepção do mundo e da vida: o nacionalismo místico, o tal que vai de Pascoaes a Pessoa e chega a Agostinho da Silva. Porque há subsolos filosóficos que vão para além de hemiplegias, do tipo monárquico contra republicano, ou de direita contra a esquerda. Por mim, filho da Renascença Portuguesa, apenas teria que ser justo, pensando até na autenticidade daqueles republicanos das campanhas de África e da Flandres que se ofereceram como voluntários, largando altos lugares de deputado ou de professor, assim mostrando como viviam de acordo com um pensamento. Estou, por exemplo, a pensar em Jaime Cortesão.

Penso também no esforço de homens como Norton de Matos, herdeiro das concepções africanistas de Paiva Couceiro, o paladino, um dos primeiros exilados do salazarismo, nessa frustrada procura de um Novo Portugal. E não poderia deixar de reconhecer que, contra o crime que foi o Acto Colonial do salazarismo, houve sucessivas gerações de monárquicos e republicanos que se coligaram contra o autoritarismo, em nome da restauração da democracia semeada pela revolução monárquica de 1820. Não estranho que possam vir, dos neomonárquicos dos dias que passam, as habituais diatribes. São parecidas às que sofreram os convictos defensores do regime derrubado em 5 de Outubro de 1910 quando a corrente dominante entre os monárquicos dos anos vinte passou a denegrir a tradição regeneradora, vintista e cartista...