a Sobre o tempo que passa: Então temos nação. Por Teresa Vieira

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

15.10.10

Então temos nação. Por Teresa Vieira



Entrámos todos numa carruagem já em andamento e ainda que as palavras e as realidades não sejam coisas fixas, grande parte da nossa culpa residiu na manutenção dos contextos e nestes, tudo o que a gente lá colocou é nosso.

Com maior responsabilidade uns do que outros, todos fizemos pouco por uma sociedade que futuramente fosse diferente em justiça daquela que encontrámos.

A nível dos próprios partidos políticos viveu-se mais de impossibilidades cénicas do que de acertos de erros para novas formas de política.

E quando quase todos repetiam já de cor o trabalho de casa agora a tabuada leva-nos ao beco e descobre-se o nanismo da criatividade para uma alternativa consistente.

Desconheço se um dia alguém chegou a deixar a luz aberta ao fundo do túnel, ou se o último que sempre lá chegou, a apagou, por desprezo para com os restantes que o seguissem.

Ainda assim, contra o impossível, é sempre possível imaginar outro impossível, mas desta feita aberto a uma sociedade que tem de deixar de ser uma coisa perigosa e passar a ser a que concebe que a maior lição, ao nível de cada pessoa, reside, acima de tudo, na capacidade que temos de provar este impossível aberto em luz e que constitui um dever real que evita o não apodrecimento da vida.

Durante muito tempo nada foi suficiente para alertar do caos. A tecnologia era auxiliar do homem e a ideologia opinativa um utensílio de uso corrente.

No que respeita ao dinheiro, ele era um recurso que media a capacidade criativa e meritória dos homens, enquanto o Estado ( todos nós ) éramos a instituição complementar também representados no tradicional choro choradinho do cá me choro pois que assim me chega mais ao bolso e menos me solicitam de esmola.
Assim a liquidez de tudo se tornava betão, e este bola de arremesso ao futuro que afinal era o presente que ninguém protegia, já que se ocupavam, agredindo-se como donos de pequenos e grandes poderes que, quando postos à prova face às injustiças, balbuciavam os tradicionais não sei, não posso ou não vi.

Neste resumo resumido da maneira de viver existe o intervalo das pessoas.

Alguém, um dia, atribuiu constitucionalmente um intervalo às pessoas, e servia o mesmo para que nestes breves minutos se discordasse a ferros das direcções tomadas, caso se sofresse daquela causa dos males da vida, ou seja, a resistência criadora de, ainda assim, se alertar para a necessidade de uma alternativa premente.

E se uma coisa é uma coisa e outra coisa é uma outra coisa, que não se substitua um poder pela adopção de um outro, sobretudo por um outro encapotado visando o apagamento da liberdade ainda que afirme o oposto.

A partir de certa altura a acumulação de desequilíbrios levou ao hábito da aceitação dos mesmos, ou, à culpa ser sempre do outro pois que quase todos se consideram  estranhos ao processo em curso ainda que o trejeito os revele.

Julgo que nos impressionou a todos muitíssimo o que se passou com os mineiros no Chile: o mesmo é dizer que nos impressionou a esperança na sua força.

Digo que a esperança, no fundo, são muitas esperanças diferentes, e por essa crença, creio que é chegado o momento de todos nos apresentarmos à Pátria remetente da missiva que nos chegou às mãos e ao discernimento.

Há que serenamente escutar a sensatez e a razão. E se esse trabalho nos parecer desde já incompleto, então temos Nação.

Então temos caminhar.

M. Teresa B. Vieira
14.10.10
Sec. XXI