a Sobre o tempo que passa: Às vezes os domingos são assim: nomeações. Apelos. Por Teresa Vieira

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

10.10.10

Às vezes os domingos são assim: nomeações. Apelos. Por Teresa Vieira



Um dia na aldeia do Miguel é o mesmo que dizer um dia na Aldeia de Lazarim. E dizer Lazarim é também dizer que ela é irmã de uma outra aldeia bem pertinho que é a Aldeia da Anta de Mazes.

Miguel é um atento filho de Lazarim. Diz-me, orgulhoso, que na sua aldeia o principal são mesmo as relações humanas. A cordialidade e o respeito entre as pessoas, o conhecimento calado que todas têm do mundo, mesmo que só tenham visitado a aldeia das casas de pedra e dos telhados de colmo que é a Aldeia de Anta de Mazes.

Depois a beleza paisagística de Lazarim é única. Tudo é único no local onde aprendemos a andar, mas ainda assim, há locais com cheiro de terra molhada ou de milho seco nas eiras que dificilmente se explica para quem não conhece o coração dos países.

É também célebre o caldo de farinha que por aquelas bandas se cozinha. Também os enchidos tão conhecidos ali da região de Lamego e fazem as delicias dos passeantes e dos residentes.

E a sazonalidade das vindimas e das empas e dos pomares e das hortas!? Tudo casa. Tudo lar. Tudo refugio quente como são as realidades que nos entendem.

E as máscaras? As célebres máscaras de Lazarim? É um Carnaval muito diferente daquele que conhecemos. É um Carnaval que, em meio pequeno, se deixam à mostra os segredos dos namoricos e das paixões trocadas. É um Carnaval que ninguém pode levar a mal como único dia em que muitas verdades se dizem a rir, enquanto a população envelhecida já as tira de cor, dos tempos em que eram eles os portadores das máscaras e que falavam as proibidas coisas das alcovas de Lazarim.

Coisa única de se ver e de se viver ! Os próprios formatos das máscaras e o material de que são feitas, envolvem a história de séculos que por ali se quedou presa também a Sta Bárbara, que é a protectora de outras festas em que o leilão das carnes oferecidas reverte para a comunidade.

Quando questionei sobre os problemas da política chegarem ou não até àquela terra, pois, como seria razoável de se entender, a realidade política gira à volta do Presidente da Junta e da sua eleição. Ainda que se entenda a existência necessária do Presidente da Republica.

Diz-me ainda o Miguel que os habitantes de Lazarim sabem bem o que é a pátria, o que ela significa, mesmo que Portugal tenha de caber entre o espaço da vinha e o fontanário: a pátria a ninguém confunde e a todos toca na defesa.

Mas falta à aldeia de Lazarim um apoio aos idosos. Muito gostava o Miguel que existisse uma casa, um lar, onde se possam encontrar as pessoas mais velhas da aldeia e onde possam ser acarinhados nas dores dos anos que chegam ao corpo, e nos sorrisos das conversas que recordam tempos distintos e que se perguntam aos dias que correm.

Se acaso destas palavras surgir o apelo palpável para a construção de um espaço que acolha estas gentes que vivem no coração de Portugal, este Domingo já valeu por si.

Obrigada

M. Teresa B. Vieira
10.10.2010
Sec XXI