a Sobre o tempo que passa: No remoinho das conversas. Por Teresa Vieira

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

21.10.10

No remoinho das conversas. Por Teresa Vieira




A Ciência não pode deixar de ser um ramo da Filosofia para passar a ser uma auxiliar de negócio.

O progresso não se pode conceber como forma de atacar a liberdade dos homens.

O filósofo de Atenas não se confina numa cátedra nem se «planifica» a pretexto de servir interesses de uma população.

Também se não pode, nem deve, eliminar os ramos científicos que não rendem, mercantilmente falando.

O destino do Homem igualmente reside no desenvolvimento ao nível sociológico que entrecruza caminhos do saber que se encontram nas mãos dos laços de pertença e que possibilitam ao Homem uma relação de conjunto, uma relação de origem.

A União Europeia, mencione-se, deve ser igualmente local de reflexão, de identificação das questões da mecânica da vida e da felicidade dos homens, mas enquanto local e não enquanto suposto cérebro de comando que, por inércia de uns desapegados das consequências da ciência dos comportamentos, aproveita a outros que se autonomeiam os pensadores da Europa.

O Homem tem-se distraído por excesso, separando-se dele mesmo, divorciando-se de si próprio, e admitindo ser auxiliar do negócio a quem a ignorância aproveite.

Se do ponto de vista social o homem não descodifica trilhos, maior é a possibilidade de se tornar alheio ao poder burocrata que o controla, e, facilmente, se converte em massa manipulável pelo sujeito do saber e do poder.

Julgamos que a consciência do que acima referimos, em muito contribuiu para a identificação da consciência com o ser, na própria poesia de Fernando Pessoa.

Os Lusíadas constituem igualmente uma excelente contemplação da máquina do mundo e dos prémios e dores que a mesma carrega. Constitui um manifesto único da Renascença europeia. Assim, podemos atentar o quanto é possível encurtar a distância entre o observador e o observado e conferir ao espírito a sua realidade de entender.

A actual crise económica pode ajudar-nos a levar a recusar o homem numeralizado e em guerra com a natureza à qual, ao mesmo tempo, se une e se tem oposto.

É que a ética e a moral não têm tido um lugar cativo na ideia de progresso da humanidade.

De um modo ou de outro, todos dispusemos de mais bens, num reverso estranho que propagou a violência nas relações humanas, nas relações entre as nações.

Todavia, nunca a essência da extraterritorialidade da solidariedade humana foi expropriada do coração dos homens.

Talvez por isto, os valores ainda atraem actualmente os homens que, ainda não completamente mercantilizados, contêm dentro de si o triunfo do valer a pena.

A sede do poder, diga-se, é uma trajectória dentro de cada ser: assim se saiba que a seta disparada já não se vira refazendo a trajectória no sentido oposto.

E tal como o espírito tem tomado várias direcções ao longo da história, a sua mutação também constitui uma realidade.

Não esqueçamos que sempre e por toda a parte se inventaram novas formas de vida.

Até numa aula, a alegria do Conhecimento pode introduzir em cada um, o quotidiano de uma hora de festa, de uma hora de paz, de uma hora de reflexão e de uma hora de futuro.

M. Teresa B. Vieira


21 de Outubro / 2010
Sec. XXI