O regresso de Pedro, o intimista, e os grupos de amigos que cordialmente se odeiam
Assisti, por dever de cidadania, à entrevista televisiva de ontem, concedida pelo nosso Primeiro em "choque de gestão", e verifiquei como ela foi eficazmente hipnótica, marcada pelo ritmo da simpática desculpabilização, na melhor das intervenções públicas do presidente do PSD nos últimos quatro meses de golpes e embustes, sem levantamentos. Porque Lopes é bem melhor neste nível do coloquial do que quando tenta aceder à dimensão mentirosa de homem de estadão, caindo no ridículo. Para não falarmos no anedótico de quando envereda pelo populismo à Alberto João.
Julgo, contudo, que esta prestação dificilmente conseguirá compensar os sinais de desleixada sobranceria com que tem inundado o povo e talvez esta mudança táctica já não surta efeito na decisão de voto, conseguindo estancar a santificação de Paulo Portas, principalmente na sua veste de herói dos comentadores de esquerda que, apesar de adversários em crenças, o consideram a direita que convém esquerda, certificando-o como o ministro da competência, apoiado por equipas de excelência, esquecendo que quase todos os CDSs da governação coligativa se ficaram pelo paradigma Cardona.
Lopes, que, mais rápido do que a sua própria sombra, já percebeu a teia compressora que lhe foi lançada, tenta deixar de ser o cavaleiro da triste figura e, temendo disparar, apenas ensaia, por enqunato, algumas fugas informativas de vitimização. Mas parece-me improvável que consiga livrar-se do vírus clássico da nossa direita burguesa, que costuma transformar os partidos e coligações que gera nesse sem espinha dos grupos de amigos que cordialmente se odeiam.
A direita a que chegámos, assente na promíscua falta de autenticidade, leva a que a ausência de lealdade, competência e convicção seja colmatada pela verbosa proclamação de lealdade, competência e convicção, onde a voz forte sempre correspondeu a argumento fraco. Talvez Lopes comece agora a descobrir a meada para onde foi sugado, tanto pelos inimigos como, sobretudo, pelos amigos de conveniência, liderados pelos prometidos parceiros. Se calhar, nesse tudo como dantes, mesmo que Relvas conheça Abrantes, a situação possa ser inversamente proporcional às relações de Portas e Barroso, que, começando por violentos choques verbais televisivos em directo, acabaram numa permanente lua de mel, com alguns adultérios sem flagrante de litro. Porque, quando os namorados de conveniência se zangam, toda a praça pública pode vir a descobrir as verdades.
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