Paul Ricoeur (1913-2005)
Estuda em Rennes e na Sorbonne. Obtém em 1935 a "agrégation". Mobilizado em 1939, é feito prisioneiro e aí começa a traduzir com Mikel Dufrenne "Ideen I" de Husserl. De 1945 a 1948, ensina no Collège Cévenol de Chambon-sur-Lignon, e depois em Etrasburgo, onde sucede a Jean Hyppolite. A partir de 1956 é professor de História da Filosofia na Sorbonne. Amigo de Emmanuel Mounier, colabora na revista «Esprit». De 1966 a 1970 ensina na nova Universidade de Nanterre, da qual se torna reitor entre Março de 1969 e Março de 1970. Vai, em seguida, para a Universidade de Chicago, (Divinity School). A convite da UNESCO faz em 1978 um inquérito sobre a filosofia no mundo.
Ideologia e utopia
Considera que podemos atingir as raias da ideologia e da utopia, apesar das roupagens vocabulares aparentemente anti-ideológicas e anti-utópicas. Da ideologia entendida como "versão do imaginário social que tende para a conservação, a justificação e a idealização da instituição existente" e da utopia que "tende para a subversão do que funciona em proveito de novas e outras formas de poder..
Hermenêutica
Concebe a filosofia, como uma "teoria geral do político", que tem a política como fim.
Estado
Muito neo-hegelianamente, fala no político como uma "totalidade envolvente" dos costumes humanos exercendo uma função hegemónica sobre as consciências políticas. O Estado é um "querer público central de vontade", pelo que "não há problema que seja politicamente neutro, isto é, sem incidência na vida do Estado". Enquanto isto, a política visa congregar os interesses e os objectivos da existência humana; é no político que se joga o destino de um conjunto geo-histórico: cidade, nação, grupo de povos.
Os valores
Salienta que os valores têm que ser históricos e não ideais supra-históricos. Porque não pode haver política sem referência a uma "cultura", a um "horizonte de valores", a um "projecto de sociedade", pelo que os que pretendem reduzir a política a uma simples ciência ou a uma mera técnica praticam uma impostura intelectual e um engano metafísico.
Contra o exagero sistémico
Observa que depois do extremo cartesiano do exagero do sujeito, caimos na "eliminação excessiva do sujeito na teoria dos sistemas, onde, porque é importante que o sistema funcione, criando-se e transformando-se a si mesmo, pelo que o sujeito desaparece completamente". Assim, na senda aristotélica, defende que toda a acção tem três elementos: o psicológico, o lógico(logos), o axiológico e o normativo (phronesis). Contrariamente aos herdeiros de Kant, não considera que a razão prática se modele pela razão especulativa, negando a separação metódica entre o "a priori" e a empiricidade.
A liberdade
Entende a liberdade como uma tarefa, como uma exigência de efectividade, de esforço do ser, de compromisso, de realização, considerando que em Kant se deu um curto-circuito entre a liberdade e a lei. Para ele o "Sollen" não pode ser concebido como uma lei exterior relativamente à liberdade, o que se traduz na divisão do homem com ele próprio. Haveria um fundamento da liberdade anterior à própria lei moral e que passaria pelo conceito de pessoa e de respeito e que se traduziria em alteridade. Considera, aliás, a hermenêutica como prática de desmistificação, compreensão e interpretação dos símbolos. Daí que a lógica da "praxis" esteja a um nível antropológico e psicológico, diverso tanto do pensamento especulativo como do nível irracional da paixão. Com efeito toda esta hermenêutica, ao ultrapassar o formalismo kantiano, recupera, de Hegel, o espírito objectivo e, de Aristóteles, a filosofia prática.
Ambiguidade do político
Proclama que "a política tem uma vocação fundamental e capacidade para reagrupar os interesses e as tarefas da existência humana; é no poder político que se desenvolve o destino de um conjunto geo-histórico: cidade, nação, grupo de povos". Neste sentido, considera que o labirinto do político é o lugar por excelência da ambiguidade do nosso tempo
Razão, crença e mito
Assume que "toda a razão tem um horizonte sobredeterminado pela crença", havendo "um ponto, onde o racional comunica com o mítico", donde deriva toda "uma constituição simbólica do laço social". Com efeito, "toda a ética que se dirige à vontade para a lançar no agir deve ser subordinada a uma poética que abre novas dimensões à nossa imaginação" Na verdade, sempre que procuramos a juridicização de conceitos como o de nação podemos atingir as figuras da falsa consciência, desde a ideologia, entendida como "a versão do imaginário social que tende para a conservação, a justificação e a idealização da instituição existente", à utopia, que "tende para a subversão do que funciona em proveito de novas e outras formas de poder"
O Ocidente
O Ocidente é um produto da Idade Média dos séculos XII e XIII, autêntico "lugar de criação", dado que "foi nesta época que nasceram todas as grandes instituições:a universidade, a moeda, o comércio, o Estado, a vida comercial". As posteriores crises, da Renascença, da Reforma, do Iluminismo e das grandes revoluções do século XIX não passariam, aliás, de meras "crises de crescimento".
Defesa do institucionalismo
Também adopta o institucionalismo, dado considerar que este difere da hipostasiação do "espírito objectivo", que, como em Hegel, leva a absolutizar o conceito de Estado, dissolvendo a riqueza das relações inter-subjectivas e a autonomia do sujeito. Para ele, as instituições são o húmus onde estão solidificados os valores e nas quais se pode exercer a alteridade, a mediação entre as liberdades. São estruturas de inter-acção que não são eticamente neutras. E é a base institucional, a ordem que assegura a tranquilidade e protege a intimidade, dado que só uma parte íntima do ser humano pode ser totalmente pessoalizada.
<< Home