a Sobre o tempo que passa: A santa aliança da casta banco-burocrática e dos pescadores de águas turvas

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

19.5.05

A santa aliança da casta banco-burocrática e dos pescadores de águas turvas



Sobre as tristes novas do real défice das nossas finanças públicas, apenas apetece recordar que os governos Barroso e Santana tentaram assumir uma legitimidade que invocava subliminarmente o despesismo socialista, por um lado, e a unção milagrosa da memória cavaquista, para assumirem a falsa imagem de uma austeridade neo-salazarenta que, apesar de usar saias em vez de tanga, já não conseguiu eficácia, por falta de adequados fundos europeus. Com Bagão, veio o "suborçamento" e o "excesso de optimismo" para se enganarem papalvos, como se a invenção da mentira da "retoma" pudesse inverter o desastre eleitoral que se anunciava.

A sucessiva repetição de proclamadas boas intenções quanto às nossas reformas orçamentais apenas revelam a verdade do que um dia disse Armindo Monteiro: a história das finanças públicas portuguesas é a história do défice. Acrescentaremos nós: a história dos vendedores de banha da cobra e dos posteriores curandeiros, a que, mais recentemente, acresceu a emergência dos reformadores encartados, monopolizados pelo restrito clube dos profissionais da pretensa engenharia financeira que, ora, são ministros no cais das colunas, ora, gestores da banca de outras colunas e arcadas. Eles, os donos de um hermético economês, em relações de promiscuidade com os donos do direitês, do europês, do educacionês e do saudês, onde apenas funciona a caixa descodificadora do politiquês, todos com restritos circuitos de banda bem pouco larga, geradores do estilo de Paulo Teixeira Pinto.

Afinal, socialistas, sociais-democratas e democratas-cristãos continuam a confundir o liberalismo com o negocismo. São todos diferentes, mas todos iguais, na cedência ao estatismo salazarento e sucialistóide, especialmente quando continuam a proclamar que justiça é igual a aparelhismo de Estado e que o poder público se identifica com o despesismo. Por mim, ser liberal não se identifica com a cedência às pressões dos "lobbies" capitalistas, especialmente no conúbio com a dita direita dos interesses, até porque esta gente sempre teve particulares relações de intimidade com os epifenómenos da esquerda moderna, como se revela nos paradigmas de Pina Moura e Manuel Dias Loureiro. Não me parecem adeptos da ética, mesmo a protestante, e consideram que o capitalismo não tem espírito. Mesmo quando se inscrevem no Opus Dei.

Tanto este modelo de classe política como o respectivo "background" da casta banco-burocrática perderam toda a credibilidade para nos poderem mobilizar na batalha da austeridade, dado que continuam a proliferar os modelos molusculares da engenharia financeira, em aliança com os pescadores de águas turvas.