a Sobre o tempo que passa: Leituras de férias V. Um liberal que os liberais de tradução em calão desconhecem

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

11.8.05

Leituras de férias V. Um liberal que os liberais de tradução em calão desconhecem



Retomando as minhas leituras de férias, fui à estante dos meus liberais que os liberais de tradução em calão desconhecem e retirei os Aphorismos e Pensamentos Moraes, Religiosos, Politicos e Philosophicos de Alberto António Moraes de Carvalho, publicados aqui em Lisboa, no ano de 1850. São cerca de mil os ditos, dos quais retiro alguns mais actualistas. Reparei que são incisivos os que se referem à corrupção: O empregado com pequeno ordenado, que vive com luxo, se não herdou, furtou (293); Os cargos do Estado, em mãos de probidade, dão proveito, e honra: em mãos de corrupção, dão proveito sem honra (300). Que há alguns conselhos para a reforma dos vencimentos da função pública: A probidade do empregado público não pode viver, nem com o luxo, nem com a miséria (297). Que já se refere a própria corrupção dos intelectuais: Os escritores assalariados, de ordinário, são como as rameiras; prostituem-se a quem lhes paga (312).

É firme a crítica do abuso do poder: Se a honra de representar a nação pela deputação fosse estéril de empregos, e distinções, haveria menos quem a ambicionasse (220). Aos déspotas nunca faltam mandarins, que sejam vis executores dos seus decretos (235). Os mais elevados estadistas dificilmente se conservam, e morrem no poder (315).

Denunciam-se os ambiciosos: Qualquer grumete se reputa habilitado a dirigir o leme da nau do Estado; por isso, ela, muitas vezes, sofre avarias (317). Porque O bom exemplo dos grandes vale mais que os códigos criminais (326). Aliás, Um governo sábio deve criar homens para empregos e não empregos para homens (384). E Há honras sem honra, assim como há honra sem honras (437). Até porque As maiorias parlamentares são muitas vezes minorias nacionais (607). Aliás, Os partidos de princípios podem ser razoáveis; os de pessoas são, de ordinário, execráveis (779). Ordinariamente os maiores inimigos dos homens que se acham no poder são aqueles que desejam subir a ele (804).