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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

3.5.07

Processado e acoimado, me confesso...















Recebi hoje um lindo desdobrável do Ministério das Finanças, onde fui objecto do processo nº 3239200716006798 e da consequente coima, de acordo com o nº 3 do art. 260 do RGIT. O motivo foi o seguinte: "Termo do prazo para cump. da obrigação 2007-04-15. Data do cumprimento da obrigação: 2007-04-16". Trata-se do IRS, obviamente. Acrescento meu: "2007-04-16 às 0 horas e dois minutos". Fiquei esclarecido. Vou pagar imediatamente. Vivo num Estado de Direito. Já deixei de fumar. Quero contribuir para a redução do défice. Gosto deste Estado-Computador. Espero que qualquer corrupto possa ser notificado com esta rapidez, dentro de alguns meses. Amen. Paga e não bufes. Somos todos iguais, mas há alguns mais iguais do que outros.

Mais iguais são os rapazes que andam por aí em consultadorias e administrações por parte do Estado, com "part times" em fundações, a quem se deu a concessão gratuita de bens públicos. São ilustres consultores avençados das novas altezas, depois de serem consultores de patronais ligadas a produtores de tempos de antenas dos partidos e a facildades nas respectivas produções, onde o beneficiado acabou por ser lixado por quem fingiu beneficiá-lo. Mas como já tudo prescreveu, quem contar a história toda ainda pode sair lixado. Logo, eu que a sei, de ouvi-la directamente aos próprios protagonistas, fico agora deliciado com as primeiras fugas de informação, duas décadas volvidas. Porque duas décadas depois, basta pegar na evolução curricular dos intervenientes para se confirmar os acasos das sucessivas nomeações por quem agora até faz discursos de apelo à ética, face à ineficácia da chamada administração da justiça.

Por mim, não repito as palavras de Marques Mendes de ontem, quando ele clamou contra a circunstância de a política interfir na justiça e de a justiça interferir na política. Como se a política se reduzisse aos políticos profissionais e a justiça aos aparelhos de administração da justiça. Porque o que nos falta é justiça na política, política com justiça e administração da justiça que ponha o direito acima da lei e a justiça acima do direito.