Actos de violência e estados de violência
Será que, por estes dias, para alguém ser de direita, nestes becos da teclagem, por entre os muitos tascos da chamada blogosfera, temos que "speak english", linha sim, linha não, bendizer São Bush, diabolizar os compatriotas de Cristo ou secundar o belo combate dos "lobbies" judaicos cá da Lusitânia? Não temam, amigos e companheiros que compreendem as dores de povos que procuram a libertação! Pois, que apareça um qualquer iluminado a decretar: quem criticar o Estado de Israel ou é discípulo da nova grande educadora do proletariado, a deputada europeia Ana Gomes, ou anda a reboque de Le Pen! A verdade custa! A pretensa direita do realismo neo-maquiavélico não pode esquecer que também há uma direita idealista ou humanista, kantiana ou cristã, venha do humanismo cristão ou siga o humanismo laico, da dita maçonaria. Aquelas famílias onde procuro enfileirar-me. Mesmo que nos saneiem ou silenciem. Minha direita é a dos velhos conservadores liberais que não querem secundar neo-conservadores ou neo-liberais. E quem, como português, recebeu uma herança de imperialismo, colonialismo, libertação e independência, quem, como nós, invadiu e foi invadido, ao longo de oito séculos e meio, tem que assumir a fundura de ir além das circunstâncias e das modas que passam de moda. Tem de compreender que há misérias e grandezas, sombra em luz, nesta caminhada da história das nações e que não podemos calcar caravelas nem fingir que não fomos império. As nações são pessoas em ponto grande. Pecam e arrependem-se, caem e levantam-se, crescem para cima, têm que crescer por dentro, com heróis e cobardes, e com alguns traidores, algumas vezes.
Eu sempre disse, neste blogue, que Arafat foi terrorista. Mas logo acrescentei que também o foram os fundadores do Estado de Israel. Porque o problema do terrorismo dos nossos dias está na circunstância de todos nós termos tido um avô dessa matriz. Mais: a própria democracia, a nossa, mui galicista, a de matriz jacobina e que só depois se tornou pluralista, nasceu de um Estado Terrorista, de um modelo político que inventou o Terror e que, tão higienicamente o exercitou, contra a Vendeia e através da guilhotina. E terroristas também foram os contra-revolucionários, como os nossos caceteiros, ou os trabuqueiros devoristas que se lhe opuseram. Ora, os fins nunca justificaram os meios. E a nossa geração já não foi à guerra ou para Paris. Mas é filha de pais que foram, de mães que choraram os mortos, de irmãos desavindos, de amigos-inimigos. Filhos da guerra, não devemos querer mais guerra. Nem nas palavras de vingança.
A habitual espiral da violência nasce sempre que se reconhece que certas situações de opressão política podem ser menos violentas do que certos actos de violência. Porque o terrorismo pode nascer de uma certa ética de responsabilidade, embora afronte sempre a ética da convicção. O terrorismo, que é justificado pela Razão de Estado, tem de ser rejeitado pelo humanismo activista. Até os próprios filhos de Mahatma Gandhi, um dos poucos que tentou resistir em não-violência, acabaram por gerar a loucura genética da União Indiana e do Paquistão, para não falarmos dessa vergonha de Nehru, que foi a invasão do Estado Português da Índia, em 18 de Dezembro de 1961, para continuar a ofender os politicamente correctos. Especialmente os centristas com complexos imperiais ou complexos de esquerda que não querem reconhecer que o colonialismo ocidental do século XX brotou, muitas vezes, do imperialismo humanitário e maçónico da esquerda republicana francesa.
Terroristas foram a Santa Inquisição e as várias purificações das teocracias protestantes, ortodoxas, maçónicas, comunistas, fascistas ou nazis. Tal como utilizaram o terror as resistências e os movimentos de libertação, alguns dos quais subsidiados por evangélicos pacifistas como os que sustentaram a UPA em Angola, nos dramáticos dias de 1961, a que nós, portugueses, respondemos com o contra-terror dos massacres ditos defensivos, para continuarmos a ser politicamente incorrectos, agora para os fantasmas de direita.
Se reconheço a legitimidade do sionismo e compreendo as causas que o provocaram, nesta Europa do "affaire Dreyfus" e do holocausto, não posso deixar de estar ao lado desse povo mártir, silenciado e proibido, o da Palestina, que já talvez tenha direito a ultrapassar a categoria de dispensável. Viva a Palestina Livre. Viva o Estado de Israel. Paz na terra aos homens de boa vontade! Perdoar não é esquecer. É aprender a procurar um mundo menos mau.
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