Os escondidos colos do combate tridimensional
Leio em dois importantes diários de hoje a mesma mensagem emitida pela direcção do PS que diz estar "estupefacta com o nível a que a campanha está a chegar" e discute, neste momento, a melhor maneira de demonstrar o "repúdio" do partido ao actual clima vivido na campanha eleitoral, em que já é o próprio Santana Lopes a fazer insinuações relativamente a José Sócrates: "O outro candidato tem outros colos. Estes colos sabem bem", disse no sábado num comício em Braga, rodeado de mil mulheres. Observo também a equívoca capa do jornal de mensagens sublimininares da Lusomundo/Delgado e sou obrigado a concluir que tudo isto é triste, tudo isto é enfado. Daí que repita o que já aqui publiquei sobre a perspectiva tridimensional do poder, mudando apenas o nome dos actores.
Numa perspectiva unidimensional, podemos dizer, especialmente numa campanha, que o exercício de um poder é uma relação na qual o actor Pedro tenta de forma visível e observável incitar um outro actor Sócrates a fazer o que Pedro quer que ele faça, mas que Sócrates não faria noutras circunstâncias. Então, se a tentativa de poder de Pedro resulta, podemos dizer que Pedro tem poder sobre Sócrates no respeitante ao conflito particular no qual eles estavam abertamente em desacordo.
Já na concepção bidimensional, o poder é como o rosto de duas faces de Janus. Se há uma face visível, onde actua a perspectiva unidimensional, há também uma face escondida que não pode ser observada directamente.
Com efeito, a melhor forma que Pedro tem de exercer o seu poder é, por exemplo, controlar o programa de debates que marca o jogo de negociação e de troca, porque, se for capaz de limitar a discussão, consegue que as decisões digam apenas respeito a questões que não ameaçam os respectivos interesses.
E tudo depende dos eventuais grupos da sueca, que baralhem e dêem de novo
Pedro pode também aproveitar as influências introduzidas no sistema político que tendem a favorecer os respectivo interesses, em detrimento dos de Sócrates.
Uma terceira hipótese é possível: é que Sócrates pode querer antecipar as represálias, não querendo afrontar Pedro numa determinada questão.
De um ponto de vista tridimensional ou radical, já se considera que Pedro exerce o poder sobre Sócrates quando Pedro afecta Sócrates de maneira contrária aos interesses de Sócrates.
Com efeito, os dois anteriores pontos de vista concordam em supor que Pedro tem poder sobre Sócrates quando Pedro afecta Sócrates duma maneira contrária aos interesses deste.
Em qualquer dos casos, não se põe a difícil questão de saber se os dois antagonistas potenciais sabem quais são os seus interesses reais.
Acontece apenas que Sócrates pode enganar-se quanto aos seus próprios interesses, isto é, sobre aquilo que os homens prefeririam (entre alternativas) se tivessem a escolha, e não o que desejam na prática, segundo a definição do mesmo Steven Lukes.
De facto, a maneira mais eficaz como Pedro pode exercer um certo poder sobre José é quando trata de exercer uma influência sobre o que Sócrates pensa ser o seu interesse e no sentido conforme aos interesses de Pedro.
Se Pedro conseguir levar Sócrates a ter uma interpretação errada dos próprios interesses do próprio Sócrates e se tirar partido da situação, então o poder de Pedro é quase total e é tanto maior quanto é praticamente invisível aos olhos daqueles sobre que se exerce.
Quem quiser fazer o jogo pondo Paulo no lugar de Sócrates, Louçã no lugar de Pedro, Jerónimo em qualquer dos sítios ou vice-versa, verá como quem manda é Balsemão, o tal que emite programas sobre prostitutos masculinos no horário nobre do telejornal, Anadia/Moura Guedes, ou um funcionário-delegado nomeado pelo ministro da propaganda para a RTP ou a Lusomundo. Filipe II se quisesse derrotar D. António Prior do Crato não precisava de mandar para cá um único soldado, nem de corromper traidores. O manifesto de Candal é uma criancinha face àquilo que aí virá...
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