a Sobre o tempo que passa: Contra os especialistas no prognóstico depois do apito final!

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

23.5.05

Contra os especialistas no prognóstico depois do apito final!



Neste jogo do "sim" e do "não" em torno da Constituição Europeia, verificamos que grandes especialistas lusitanos em matérias da omniciência transpiramidal continuam mestres na arte de fazerem profundos prognósticos depois do apito final, naquela postura típica dos adesivos e viracasacas que sempre foi a do "nim". Estes seres intermediários, molusculares e viscosamente dependentes de uma engenharia conceitual que procura conciliar Deus com o Diabo e Mafoma com o Toucinho, ainda consideram que Portugal vive em processo de "integração europeia", submetido a uma "adesão" alienígena, não se considerando situados no próprio "centro da Europa".

Por mim, digo "não", assumindo a plenitude da cidadania europeia, porque não me considero um europeu de segunda velocidade, na periferia de uma geometria variável que me obriga ao temor reverencial e à filosofia da mão estendida ao subsídio do fundo estrutural. Digo "não" porque me apetece dizer "sim" a uma Europa pós-soberanista e até federalista, se entendermos por federação, não o neofeudalismo dos impérios frustrados que se pensam locomotivas do projecto europeu, mas o sonho antijacobino de uma democracia de muitas democracias e de uma nação de muitas nações, atingindo o universal pela diferença! E quem reduzir o nacionalismo ao soberanismo até deve reparar que um dos nossos primeiros teóricos da tal soberania se chamava Miguel de Vasconcelos e estava ao serviço da soberania dos Filipes!

Há, com efeito, uma parcela do "sinzismo", talvez minoritária, que tem o "cinzismo" dos sucessivos situacionismos, marcada pelo conformismo do "sim, senhor" e com argumentos que tanto davam para defender o último dos impérios coloniais da Europa, como para justificar a nossa não-opção pela democracia. Até, depois, serviram para alguns posteriores senadores da democracia cederem ao PREC, proclamando a infeliz impossibilidade de uma "democracia burguesa", em pleno gonçalvismo, enquanto outros se escapavam, para que os indígenas tivessem que domar a fera, com a vontade militante e o realismo dos sonhadores activos. E custa ver o europeísmo enrodilhar-se nesta falta de espinha dos que, submetendo-se para sobreviverem, não conseguem compreender que vale a pena lutarmos, para continuarmos a viver. Alguns dos que agora "sinzam" são exactamente os mesmos que, ainda há anos, teorizavam a impossibilidade da independência de Timor ou a inexistência da Guiné-Bissau. Por isso é que sempre se deram mal com os "jovens turcos", mesmo quando estes já têm as barbas brancas.