a Sobre o tempo que passa: Estar aqui sentado

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

7.7.05

Estar aqui sentado

Estar aqui sentado: a caneta, o papel, a cadeira , a mesa,
e eu próprio diante de mim mesmo.
Aqui sentado diante da solidão
ouvindo em fundo qualquer música que seja apenas música,
sem dizeres que possam poluir
a palavra certa que procuro descobrir.
Aqui sentado deixando escorrer de mim
as palavras aprisionadas de um poema por fazer
E dedilhando a lira do momento
novas palavras reinventar
até que o poema redivivo possa de novo acontecer.
Aqui sentado, forçando o verso,
aqui sentado a escrever e rescrever
sofrendo o peso do passado.
E sempre a tormenta de peregrinar
sobre meu próprio escrever
procurando na dor da escrita
o prazer de todos os dias escrever.
Estar aqui sentado, forçando o verso,
escrevendo por ter de escrever
quando há tantas coisas que tenho de fazer
quando há tanto poder ser.
Sobretudo essa ilusão de fazer
que me dá razão para viver.