a Sobre o tempo que passa: "Libido dominandi", neo-sidonismo encapotado e salazarismo democrático, com saldos de "marketing" político

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

29.11.05

"Libido dominandi", neo-sidonismo encapotado e salazarismo democrático, com saldos de "marketing" político



Porque as notícias continuam a não ser notícias prefiro recordar meu fim de semana de visita a feiras da cidade, entre a de agricultura biológica, com hamburgas de porco preto, chamuças do Nepal e chás de alecrim e gengibre, que nos dizem pôr o sol por dentro, bem como os "dips" de azeite varejado pelos próprios, com muito regresso ao sabor da terra sã, procurando compensar as casas da cidade à espera de chuva, mas sem se cair no exótico do discurso contra a globalização neoliberal que só compra produtos nas lojas do comércio dito justo, que é coisa de loja dos trezentos para "radicalchic" do politicamente correcto.



Reparo que as viagens dos candidatos ao país profundo, revelam a falta de adequada mobilização por parte da Joana Amaral Dias, da Cátia Guerreiro e do Pacman, porque a fauna que recebe os pretensos pais da pátria se reduz ao habitual frequentador de comício, com predomínio dos sessentões, até porque os chamados ministérios educativos ainda não lançaram a urgente campanha de cidadania que leve os jovens à inscrição no recenseamento eleitoral. É por isso que no domingo fui às rolas dos Moinhos de Santana, em busca do habitual cozido à portuguesa, com enchidos da Beira, num ambiente marcado pela imagem que encima este parágrafo, nesta memória de paisagem saloia no Alto do Restelo.



Finalmente dei um saltinho à FAC, que é a AR.CO a que os portugueses têm direito, ficando perdido no meio de tanto quadro, tanto pincel e tanta criatividade,onde não faltava uma caricatura de Fernando Aguiar sobre a vontade de poder que decidi não censurar. Reparo, contudo, no modelo de propaganda dos candidatos presidenciais, especialmente no paradigma Cavaco, que, na gestão dos silêncios, tenta traduzir em calão o perception's management à Karl Rove, onde não faltam as tais visitas ao país profundo, mas onde, na prática quotidiana, a teoria tende a ser outra, pelo recurso aos saldos de um marketing político que usa e abusa do slogan politiqueiro.



Porque o subliminar de um neo-sidonismo encapotado, com pitadinhas de salazarismo democrático, faz como Sócrates nas legislativas: aproveita a embalagem da inércia. E até pinta de fresco propagadismos dos anos sessenta do século XX, entre o "I have a dream" de Luther King, dito agora "tenho uma ambição", e as quase novas fronteiras do John Kennedy.



Afinal os três principais presidenciáveis são o próprio situacionismo em figura humana que fazem discursos contra a degradação da presente democracia quando eles são os criadores da criatura que agora fingem rejeitar. Porque o Estado a que chegámos, apesar de ser grande demais na subsiodiocracia e na empregomania, não é suficientemente forte para combater a corrupção, a evasão fiscal ou o indiferentismo que nos seca a cidadania. Porque o sistema de financiamento da política, da partidocracia às campanhas presidenciais, passa pela habitual complacência do Bloco central de interesses face aos patos-bravos autárquicos, aos "lobbies" das consultadorias e empresas de estudos, com passagem pelo poder banco-burocrático que os encima e onde participa a procissão dos intelectuais que andam de mão estendida ao subsídio ou à avença.