a Sobre o tempo que passa: Partido Socialista: de Fontana a Ramada Curto

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

10.1.06

Partido Socialista: de Fontana a Ramada Curto



O Partido Socialista foi fundado em 10 de Janeiro de 1875, na sequência do Congresso de Haia. Assumia-se, então, como marxista contra o bakuninismo, como depois vai tornar-se proudhoniano, embora antes se tenha destacado no Porto, com o apoio à eleição de Joaquim Pedro d'Oliveira Martins como deputado progressista, com o apoio dos miguelistas e em nome da memória patuleia que queria restaurar o partido de Passos Manuel. Da sua primeira comissão directiva fizeram parte José Fontana, Azedo Gneco, Nobre França e Tedeschi. Antero Quental, autor do folheto O que é a Internacional, de 1871, estava nos Açores desde 1873, por morte do pai. Teve como órgão O Protesto, em Lisboa, e o Operário, no Porto, até surgir a fusão em O Protesto Operário.. O primeiro programa apenas data de 1895.

Fontana fazia saraus operários lendo trechos do Portugal e o Socialismo de Oliveira Martins, editado em 1873. Carteava-se com Quental para pôr de pé o programa. Mas, não conseguindo juntar os restantes membros do Cenáculo chegou a dizer que, para não haver cismas, assentara-se em não haver programa Veio a suicidar-se em 2 de Setembro de 1875. O I Congresso reuniu 23 associações e 48 delegados.



Em 1877 surgiu a primeira cisão quando Azedo Gneco patrocinou a candidatura de Oliveira Martins pelos progressistas, no círculo do Porto, com a desistência dos socialistas. No II Congresso, de 1878, 17 associações e 48 delegados. Aí se abandonaram as teses da abstenção, resolvendo-se que o partido nunca deveria deixar de ir à luta eleitoral. Nesse ano, o partido muda de nome, quando se funde com a Associação dos Trabalhadores da Região Portuguesa, passando a designar-se Partido Operário Socialista Português, sob inspiração das teses guesdistas. Em 1879 surgiu a dissidência do grupo A Voz do Operário, órgão dos manipuladores de tabaco já anarquista. No Congresso de 1880, o partido estava já reduzido a 9 associações.



No Congresso de 1885 surge novo programa do partido, inspirado no federalismo de Proudhon, alheando-se da luta revolucionária e do princípio da luta de classes. Com efeito, em 1884-1885 começou a intensificar-se o anarquismo e a respectiva propaganda, principalmente quando a partir do momento em que Manuel Luís Figueiredo e Viterbo de Campos participaram no Congresso Internacional de Paris de 1889. Surgiu então o confronto entre os economicistas, possibilistas defensores das reformas (Luís Figueiredo) e os marxistas ou revolucionários (Azedo Gneco). Os primeiros publicam O Protesto Operário e o Trabalhador, mobilizando Carvalho e Cunha, Agostinho da Silva e José Martins. Os segundos publicam o Eco Socialista e têm a apoiá-los Nobre França, Domingos Leite, Conceição Fernandes, Viterbo de Campos e Luís Soares. Estes dois grupos, maioritários, distinguem-se de mais dois: o grupo dito dos ecléticos, que publicam A Voz do Operário e o Amigo do Povo e o grupo dito dos socialistas de Estado, com Sousa Brandão, Costa Goodolphim, Liberato Correia, Augusto Fuschini, Jaime Batalha Reis e Oliveira Martins.


A verdadeira vocação dos portugueses é socializar os prejuízos e individualizar os lucros (Ramada Curto)

Como então reconhecia Nobre França, o que hoje existe tem pouca significação verdadeiramente socialista. O que predominam são agremiações, animadas pela burocracia, esperando pelas cebolas do Egipto. Em 1897 houve uma cisão dentro do grupo de Gneco, quando Ernesto Silva e Teodoro Ribeiro pretenderam uma aliança com o Partido Republicano, tendo surgido uma aliança republicano-socialista.

Alguns socialistas chegaram a apoiar Sidónio, levando a uma divisão em 1919, com o ministro socialista Augusto Dias da Silva a receber apoio dos anti-sidonistas. Na altura, conseguiram 4 deputados (2.126 votos em Lisboa e 1 569 no Porto). Realizou-se então, em Outubro de 1919, o Congresso da Figueira da Foz. Seguiu-se o X Congresso de Maio de 1922, em Tomar. No XI Congresso, realizado no Porto, em Junho de 1924, o partido passou a ser dominado por Ramada Curto e Amâncio Alpoim. Tinham então, no Porto, o jornal República Social e em Lisboa O Protesto.