A Europa que começa a não estar connosco...
Reparo que a mensagem dos académicos para os políticos foi clara: a competência para fazer qualquer reforma no Ensino Superior só pertence aos quadros superiores universitários. Até porque as directrizes traçadas pelo Processo de Bolonha não estão a ser bem aceites pelos académicos que se insurgem contra a ideia de um modelo único de ensino. As conclusões não deixam dúvidas: a reforma só avança se cada país puder ter em conta as suas especificidades e a própria realidade de cada tecido social. O que significa que até mesmo os níveis de competências exigidos aos alunos, bem como as suas qualificações, embora reconhecidos por todos, devem ser adaptados e desenhados de acordo com a estrutura e situação social de cada país.
«Temos que trabalhar em conjunto, mas também tendo em conta que não somos iguais, pois a diversidade que caracteriza cada um dos países onde leccionamos tem que ser preservada», diz Patricia Pol, vice-presidente do departamento de desenvolvimento internacional da Universidade de Paris...etc.
Vimos, ouvimos e lemos, mas os nossos responsáveis, políticos e académicos, continuam a ignorar, têm de ser arrastados pelo mainstream. Preferem cantar a loa da Europa connosco, apenas conjugando o verbo no pretérito imperfeito. Entretanto, a cadeia do rolo unidimensionalizador vai-se alargando em chouriçadas decretinas, transformando as secções universitárias com menos poder de pressão em pequenos gabinetes de planeamento de "curricula" que vão tirando da "Internet", com imenso "copy and paste", enquanto jovens assistentes fazem noitadas, com tabelas de equivalência lançadas em papel quadriculado, longe da vida, longe do sonho e, sobretudo, longe da sabedoria.
Pobres os que, depois da destruição, ficam à espera do que há-de vir, porque o que parecia ter que ser pode não vir mesmo. Entretanto, à bela maneira das passagens administrativas do PREC, alguns líderes institucionais, em processo eleitoral, prometem facilidades, onde os velhos quartos anos da licenciatura, com uma simples tese, podem transformar-se em gloriosos mestrados e ser rampa de lançamento para mais futuríveis dissertações de doutoramento.
Vale-nos que os romances de cordel contam as recentes aventuras das privadas e acirram este nosso sonhar é fácil do enquanto o pau europeu vai e vem folgarem os costados do chico-esperto, sentado na encruzilhada deste potencial regime de passagens administrativas, à procura do canudo e da melhoria das estatísticas, como se, do regabofe, alguém pudesse lucrar.
Julgo que a autonomia das universidades assenta na autonomia dos professores e na consequente meritocracia, coisa que deveria ser sinónimo de democracia, de escola de cidadania e de semente de homens livres. Não esperemos que a terapêutica de um futuro ministro das universidades seja capaz substituir-se à necessária profiláctica.
Por mim, serei consequente e não irei por aí. Não subscreverei esta ameaça de degradação académica, pedagógica e científica que vai germinando. Quando uma democracia passa a ser o reino da quantidade, não tardará que os inimigos e críticos da democracia a assaltem por dentro... os sinais que vislumbro no meu quintal são óbvios demais. O ensino superior continua à procura de bom senso!
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