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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

7.5.07

Ontem, dia de todas as mães, foi também o dia mundial do riso...


As caricaturas de neofascismo e antifascismo epidermicamente borbulhosas e que por aí nos agridem a inteligência ficaram, ontem, estupefactas com nova maioria absoluta para a social-democracia madeirense, bem como com a vitória inequívoca dos restos da heróica resistência anti-nazi dos franceses. Não estou a ironizar, estou a dizer a verdade. Melhor: estou a dizer como as boas ideias se podem gastar pelo uso e prostituir pelo abuso.

Muito terra a terra, direi, começando pela pérola do oceano, que essa mistura de absolutismo democrático com personalização do poder, chamada Alberto João Jardim, atingiu o clímax do paroquialismo, transformando a autonomia regional em algo que continua a depender de uma constipação mal tratada. Com efeito, o melhor dos nossos sindicalistas políticos, defensor de causas de uma sociedade imperfeita contra os maus praticantes do princípio da subsidiariedade, apenas demonstrou como o nosso sistema político continua dependente de sucessivas ditaduras da incompetência.

Basta assinalar que há bem menos eleitores na Madeira do que na autarquia lisboeta, dado que o arquipélago equivale às autarquias da região saloia e é pouco maior, em termos de quantitativo de cidadãos, do que a minha região natal, o Baixo Mondego. Alberto João, que votou contra a regionalização do continente, porque quer ter o monopólio de tal instrumento, nada mais é do que o herdeiro daquilo que, no salazarismo, foi Bissaia Barreto para a minha terra ou Camilo de Mendonça para os transmontanos. Ainda bem que conseguiu pôr a Madeira no mapa.






Apenas reparo que Paulo Portas ficou no parlamento funchalense com tanta representação parlamentar quanto Manuel Monteiro, embora o partido deste apenas tenha tido cerca de metade dos votos dos endireitas do Caldas. Pouco me interessa. Prefiro saudar o novo deputado regional, Baltazar Aguiar, meu antigo aluno e meu querido amigo, que é bem mais do que o episódio Manuel do Bexiga, dado que andou, durante anos, a fazer trabalho político com ideias e muitos episódios de coragem e que bem merece o investimento que fez, com o apoio sincero do seu cunhado, numa união de amizade política e de solidariedade pessoal.

Agora a bola passou para Lisboa, onde o Presidente da República tem de tratar com o Presidente do Governo Regional da Madeira, tal como o antigo presidente do PSD nacional, Cavaco Silva, teve que tratar, durante tantos anos, com o permanecente Presidente do PSD-Madeira, Alberto João Jardim. Ambos têm uma secular experiência de conhecimento mútuo e ambos podem ajudar Portugal e a Madeira a ultrapassar a presente crise.

O PS foi tolo. Até despachou para o Funchal, como consultor de Alberto João, o seu militante madeirense que elevou à categoria de coordenador geral do PRACE, para gáudio do líder laranja do regionalismo, bom conhecedor das vaidades continentais e dos meandros das leis, inclusive da que não proíbe campanhas eleitorais à noite, com inaugurações oficiais durante o dia. Aliás, até a magistral figura do presidente da CNE foi recebida em hospitalidade antes da campanha pelo senhor da região, a fim de ir à televisão justificar a conduta habitual do mesmo, como se a ética política dependesse de uma bagatela processual.


Em França, apenas confirmámos como a Europa deixou de depender dos habituais especialistas no europês, os tais que nunca conseguiram vislumbrar que é possível, e desejável, o "oui par le non" de uma Europa das Nações. Os tais que nem sequer reparam que os principais ideólogos de Ségolène Royal foram dos principais socialistas que estiveram por trás do movimento que levou ao "não" francês, no referendo ao tratado constitucional proposto por Giscard.

Quem não reparar que a complexidade crescente levou a novas direitas e a novas esquerdas pode continuar a assistir ao programa prós e contras de logo à noite, onde a esquerda do futuro é representada por Mário Soares e a direita, também do nosso excesso de mais do mesmo, terá a voz de Adriano Moreira, ambos assessorados por Paulo Rangel e Miguel Portas, para que Jerónimo de Sousa fique em desespero, apesar de ter ficado em terceiro lugar na Madeira.


Isto é, a nossa modernidade continua a viver de traduções em calão, com dezenas de anos de atraso, dado que não conseguimos racionalizar imediatamente as nossas realidades, entre o Manuel do Bexiga e o Alberto João, enquanto perdemos latim a comentar o Carmona e as candidaturas de Ana Paula Vitorino, pelo PS, de Teresa Caeiro, pelo PP, e de Paula Teixeira da Cruz. Quando Sócrates bem quereria livrar-se de António Costa e Marques Mendes ter imaginação criadora para lançar Maria José Nogueira Pinto, enquanto Paulo Portas acabará por optar pela solução de Bagão Félix e Manuel Monteiro poderá aparecer com o Gato Fedorento, dado que o filho do ex-edil Fernando Santos e Castro prefere a autarquia de Odemira.

Eu, que apoiei António Barreto e Gonçalo Ribeiro Teles, no apelo à candidatura de José Sá Fernandes, apoiaria agora o primeiro numa candidatura independente, dado que a criatura se libertou dos criadores e passou a partidocrata, como era pevisível e que o meu conhecimento dos meandros do dolo eventual sempre admitiu...