a Sobre o tempo que passa: O "big brother" disse que era a mudança da modernidade e anuncia que foi tudo mera quebra de "links" onde a culpa vai morrer solteira... Toma!

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

19.8.07

O "big brother" disse que era a mudança da modernidade e anuncia que foi tudo mera quebra de "links" onde a culpa vai morrer solteira... Toma!



Entre a madrugada de ontem e os começos desta manhã de domingo, o grito de revolta que aqui lancei demonstram como a resistência e a revolta das palavras são necessárias. Agradeço o militante apoio que temos recebido da blogosfera: do João Gonçalves, do Luís Bonifácio, do Miguel Castelo Branco, do Pedro Guedes, de A Origem das Espécies, de Magude, do Anarca Constipado, do Ao Encontro do Tempo, de A Ilha dos Amores, do Macroscópio, para referir os que me chegam apenas pelo registo das primeiras consultas ao "site meter". Não posso divulgar os "mails" e "sms", até porque grande parte deles é de quem teme pela carreira, pelo subsídio de viagem científica e pelas prebendas que os burocratas do estadão vigente na universidade distribuem pelos não rebeldes.




Cumpre-me sublinhar que a primeira manifestação de solidariedade veio de um simples aluno que teve o privilégio de poder ir estudar para o estrangeiro e livrar-se do "big brother" concentracionário que nos continua a proibir o "português à solta". Outros citaram Orwell e propuseram Talião. Colegas sugeriram mera guerra de papéis. Juristas eminentes, o recurso aos meandros da justicite. Apenas apetecia transcrever os apelos que me foram dirigidos pelos dois jovens colaboradores de então, hoje mais amadurecidos pelos exílios internos e externos, mas não gosto de auto-elogios.




Apenas digo que, hoje, o "big brother" emitiu há pouco o seguinte decreto: como já anteriormente dito, muito se agradece todas as contribuições, visando o apuramento do novo site do ISCSP - como a carta infra, cuja parte relevante já foi encaminhada, para se repor o link perdido na mudança. Por outras palavras, o limpamento ordenado foi qualificado como avaria técnica dos pretensos saltos tecnológicos e a defesa dos direitos da memória foi reencaminhada para outro braço anónimo do mesmo "big brother", uma coisa que tanto pode ser uma oficina de vão de escada que recebe ordens do chefe de repartição, como um qualquer recibo verde que pode deixar de ser pago caso não se obedeça ao adjunto do subchefe do chefe, ao melhor estilo daquilo que Hannah Arendt qualificou como "governo dos espertos", em aliança com o "domínio perpétuo do acaso" e do senhor "ninguém".




Entretanto, o "big brother" vai dizendo: eu sou Portugal, eu sou a República, eu sou o Estado, eu sou a Universidade, eu sou a Escola, eu sou a mudança e as quebras de "links" são negligência e não dolo, nem sequer eventual. Logo, mesmo que a negligência gere cessantes homicídios culturais, a culpa continua solteira. E nada melhor esperar que a justiça lentamente mate mesmo a liberdade.




Por isso, continuarei a resistir. A liberdade não tem férias nem fins de semana. Obrigado, blogosfera! Viva a república universal das pessoas livres e da consequente sociedade civil internacional, enquanto não eliminarem os "links" e o espaço nos servidores, ao serviço de um pretenso pensamento único. Reparo, contudo, que sou um privilegiado: professor catedrático, subdecano da instituição, com alguma voz. E que conheço os meandros dos pré-totalitarismos, com algumas provas prestadas.
O que está a acontecer não é mera vingança. É meticulosa repetição da velha estratégia do maquiavelismo clássico. Se eles até decapitam quem não se submete à corte, todos os outros se moldarão sem necessidade de repressão, gerando-se uma maioria de cobardes, sobre a qual será mais fácil o exercício do unidimensional rolo compressor. Daí a táctica do salame e das correias de transmissão, para que o rebelde ou o dissidente possa ser qualificado como doidinho pelo pelourinho da paz dos cemitérios.
Um desses aliados dos novos donos do poder, ainda há semanas me confessava, no silêncio do gabinete que não tinha dúvidas em mandar-me fuzilar se a revolução dele triunfasse, apesar de continuar meu amigo. Como eu o conheço desde a adolescência, apenas me lembro que, ainda no tempo dos seus amigos pides, o respectivo directório condenou um puto de dezasseis anos a abandonar um acampamento parapolítico a quinhentos quilómetros de casa e a ver sem dinheiro nem transportes nem dinheiro, à boleia, só porque recusei queimar uma bandeira estrangeira e saudar a nossa com uma certa postura. O puto era eu e ainda sou rebelde. Os novos aliados do dito são aqueles que ele chamava inimigos e que, afinal, não passam de irmãos-inimigos.
Como professor, não é a minha pessoa que está em causa. É o exemplo que devo dar. Aliás, ainda há dois anos, o "big brother" ainda me ofereceu o poder de carregar no botãozinho da campainha com que se liquidam mandarins no exótico ou na vizinhança. Recusei. Não lhe reconheci autoridade para me dar poderes que não são dele. Eu sei resistir. Não sei se as instituições que eles capturaram já o podem fazer sem o exílio dos homens livres.