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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

11.10.07

De boas intenções, continua o inferno científico cheio... Menezes que se cuide!


Só há pouco tempo me foi dado ler o salvífico discurso presidencial do 5 de Outubro, onde o heterónimo de certo político, que também se chamou João de Deus Pinheiro, Roberto Carneiro e Manuela Ferreira Leite, veio agora denunciar as consequências daquilo que foi um dos principais causadores. Preferi continuar a ler Montaigne e o tradicional exercício sobre a preferência das letras às armas, incluindo as politiqueiras, porque, num tempo em que algumas luminárias pretenderam constituir uma ordem dos cientistas, reparo como continuamos subsidiários dos grandes armazéns de um terceiro mundo pretensamente esclarecido, numa espécie de arquipélago de oficinas "outsourcing", contratadas a recibo verde, pelos adjuntos das multinacionais do "hardware".


Vem isto a propósito das pouco noticiadas ocorrências de certos meandros universitários em processo de aplicação da lei Gago, dado que os mesmos parecem ter menos relevância mediática do que o conflito de uma frase de José Rodrigues dos Santos contra a administração Morais Sarmento da televisão pública, ou do que o conflito de propagandismos entre os sindicatos da CGTP e o "agenda setting" do nosso Primeiro, quando ambos mobilizam segmentos de povo para o palco dos acontecimentos televisivos. Uns com o militantismo, outros com excursões de aposentados de província; uns com o activismo dos "amanhãs que cantam", contra o "regresso do fascismo", outros com figurantes de agências de "casting", ou com actores profissionais recrutados para cerimónias de pretensa ocupação partidária da ideia de república, mas ambos exagerando no espectáculo, isto é, gastando-se pelo mau uso.


Por outras palavras, a borbulhagem de pequenos nadas que precede o Congresso do PSD e a entrada de Luís Filipe Menezes no palco dos horários nobres tem sido ensombrada pelas manobras de certa contra-informação, onde a pedrada no charco da ex-provedora Catalina recebeu uma inusitada fúria verbal do blogue do Professor Vital Moreira, através de Ana Gomes, que, abordando a nebulosa da pedofilia, até referiu o caso de dois ex-ministros de eventuais maus costumes, cujos nomes todos cantarolam no "boca a boca" das elites e que, a confirmar-se, impõe que a moral social consiga varar os rígidos limites da prescrição, para que não continuemos a lavar as mãos como Pilatos.


Daí que possa parecer de somenos a "inside information" que corre pelos corredores e "mails" da minha universidade, onde consta que a passagem a fundação da jóia da coroa de Mariano Gago teve um pequeno obstáculo quando, num plenário do IST, a facção ministerial foi derrotada pela facção reitoral por uma escassa meia dúzia de votos. Por outras palavras, Menezes ficou com uma castanha quente, dado que, neste caso, recebe a pesada herança de ter que gerir uma oportunista aliança entre o engenheiral PCP e o não menos engenheiral PSD, o que até pode reforçar a frente antigaguista, liderada pelo reitor da Universidade de Coimbra e pelos seus "compagnons de route" do Conselho de Reitores.


Os jogos politiqueiros que transformaram a universidade portuguesa num sucedâneo de partidos em degenerescência, onde facções brincam a slogans da velha unicidade e a manobras de serôdia RGA, mostram como se abriu a caixa de Pandora de sucessivos grupos de pressão e grupos de interesse, com o consequente neofeudalismo, contrário a reformas e reaccionariamente incrustado no pior dos conservadorismos: o apego ao poder dos que querem conservar o que está, mesmo que decorem a nudez desta verdade com os diáfanos mantos da música celestial, tipo "viva a escola pública!". O antigo manobrador intelectual de RGAs, agora sentado na cadeira ministerial do Estado de Direito, tem uma tarefa árdua nesta sua saga de criar dois ou três exemplos de fundações universitárias públicas. E Menezes tem que responder ao desafio de não admitir que alguns dos repectivos eleitos deixem de ser a inesperada correia de transmissão de certo neo-reaccionarismo de saudades prequianas, numa santa aliança que até pode ter enredado certos deslumbramentos gestionários, feitos daquelas boas intenções de que o inferno está cheio...