a Sobre o tempo que passa: Breves confissões de quem vai rendilhando bilros conceituais na sua teia de Penélope

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

14.1.08

Breves confissões de quem vai rendilhando bilros conceituais na sua teia de Penélope


Tenho andado voltado sobre papéis antigos, quase prontos para publicação e que já foram testados aqui na Internet: o projecto de uma biografia do pensamento político, cujas sementes podem ser espreitadas aqui, a partir da coluna da esquerda deste blogue. O trabalho é quase beneditino, nisto de pensar o pensamento pensado. Até porque ele foi finalmente desbloqueado pelo senhor editor, depois de, há já um ano, ter sido remetido para a gráfica.


Como, muito à maneira dos estóicos, costumo encarar, cada livro que vou compondo, como se ele fosse o último, vivendo a angústia criativa da criação, quem me conhece para além da imagem que transmito, pode compreender a memória de sofrimento que significa este acto de libertação, bem como o desprezo que sou obrigado a nutrir pelos plurisseculares métodos da razão de Estado e pelas manhas inquisitoriais, de fabricação seminarista.


O que permanece é o que resguardo em mim e cujos contornos e pormenores eu próprio não sei na sua minuciosidade. Têm a ver com aquilo que alguns dizem sonho, entre o projecto de um livro, ou outros sinais de pátria prometida. E sempre esta intuição divinatória que me dá o impulso para procurar o sempre. Por isso, esqueço a mesquinhez da hiper-sensibilidade polémica que dá aura ao sindicato do elogio mútuo. Todos temos a nossa pequena "via crucis". Por mim, prefiro escrever-me e rescrever-me. Sinto. Rememoro.
Logo, não vou comentar a ASAE, o Banco de Portugal ou a entrevista de Medeiros Ferreira, anunciando a sua entrada na revolta, à maneira de Manuel Alegre e de outros homens livres. Nem sequer vou comparar Menezes com Sarkosy e Sócrates com Bush. Estou farto destas notas pé-de-página que um dia ninguém assinalará, quando for inaugurado o aeroporto de Alcochete ou mais um contrato da Lusoponte, essa empresa privadíssima que tem, agora, como presidente o ministro que lhe deu o genesíaco de um contrato de concessão do Estado. Todos os Ferreira do Amaral sonham com Fontes Pereira de Melo, mas acabam no pequenos círculo da empregomania, mesmo depois de serem candidatos a presidente da autarquia. Os progressistas e os regeneradores são cada vez mais PS e PSD, ou vice-versa.


E nesta viagem, me viajo. Qua aqui, dentro de mim, apenas sou tudo quanto trago. Porque sou e recordo. E bastam imagens de sonho com que confundo o tempo que, aqui e agora, me vai passando. Ficará sempre um projecto por cumprir neste meu aquém. Felizmente, o melhor de quem podemos ser nos passa além. Porque não seríamos se a perfeição não fosse sempre a procura da perfeição. As essências precisam de existência e o "eu" de circunstâncias.