a Sobre o tempo que passa: Contra a ameaça da balcanização interna....

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

22.2.08

Contra a ameaça da balcanização interna....


Anteontem foi o bastonário da Ordem dos Advogados, ontem o general Leandro, agora a velha SEDES: sente-se hoje na sociedade portuguesa um mal-estar difuso, que alastra e mina a confiança essencial à coesão nacional. Nem todas as causas desse sentimento são exclusivamente portuguesas, na medida em que reflectem tendências culturais do espaço civilizacional em que nos inserimos. Mas uma boa parte são questões internas à nossa sociedade e às nossas circunstâncias. Não podemos, por isso, ceder à resignação sem recusarmos a liberdade com que assumimos a responsabilidade pelo nosso destino...


Ao nível político, tem-se acentuado a degradação da confiança dos cidadãos nos representantes partidários, praticamente generalizada a todo o espectro político....


Outro factor de degradação da qualidade da vida política é o resultado da combinação de alguma comunicação social sensacionalista com uma justiça ineficaz. E a sensação de que a justiça também funciona por vezes subordinada a agendas políticas. ..


A criminalidade violenta progride e cresce o sentimento de insegurança entre os cidadãos. ..


O mal-estar e a degradação da confiança, a espiral descendente em que o regime parece ter mergulhado, têm como consequência inevitável o seu bloqueamento. E se essa espiral descendente continuar, emergirá, mais cedo ou mais tarde, uma crise social de contornos difíceis de prever.A sociedade civil pode e deve participar no desbloqueamento da eficácia do regime – para o que será necessário que este se lhe abra mais do que tem feito até aqui –, mas ele só pode partir dos seus dois pólos de poder: os partidos, com a sua emanação fundamental que é o Parlamento, e o Presidente da República.


Esperemos que, dentro de dias, surja idêntica análise da Conferência Episcopal Portuguesa ou do Grande Oriente Lusitano, para não falarmos de uma declaração conjunta das duas centrais sindicais ou de outras forças morais e sociais. Porque vão ardendo embaixadas em Belgrado e não satisfaz a explicação neo-realista, segundo a qual importa comprar a Albânia e o Kosovo para que tais sítios se não transformem num narco-Estado ou numa base do fundamentalismo terrorista. Porque quem vai pagar a crise somos nós todos, mesmo que continuemos a ter um ministro do "deficit" como ministro da reforma daquilo que deveria ser um cérebro social. Por mim, apenas não me quero balcanizar. O governo de José António Maria da Silva e Sócrates não é causa da crise. Não passa de mero sintoma...
Quando o poder instalado recusa o "vemos, ouvimos e lemos", apenas porque certos senadores dizem que ele se deve fiar na virgem do não haver alternativas ao que está, tanto no PS como no país, só porque o resto se chama menezes, portas e quejandos, talvez seja necessário o ovo de Colombo da imaginação no poder. Por exemplo, a extinção do município de Lisboa e a urgente instauração de uma nova forma de governação autárquica e regional nesta área metropolitana, à semelhança de coisas equivalentes na Europa. Infelizmente, preferimos continuar a demonstrar que um burro sobe mais depressa a Calçada do Carriche do que um Ferrari e continuamos a não poder dar um mergulho nas poluídas águas do Tejo, a não ser que se utilize, como princípio da subsidiariedade, um desses pareceres dos ilustres administrativistas que servem os interesses de Stanley Ho...
PS: Mestre Harold Laski continua a dizer-me em surdina: o problema central da política é o problema da autoridade e da liberdade, a tensão entre a soberania do Estado e a obrigação moral de resistir, porque o poder somente é válido quando recebe, daqueles que lhe estão sujeitos, a livre anuência à autoridade que ele procura exercer.