a Sobre o tempo que passa: Elites, meritocracia e memória dos Filipes

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

5.4.10

Elites, meritocracia e memória dos Filipes

É um dos exercícios favoritos da imprensa norte-americana: medir o poder e com ele elaborar a lista dos homens e mulheres mais influentes do mundo. Barack Obama é o primeiro (ninguém abre a boca de espanto), seguido de líderes como Hu Jintao, presidente chinês, ou Nicolas Sarkozy, o homólogo francês. Até Osama bin Laden e Oprah Winfrey lá estão (aqui já há algumas sobrancelhas franzidas). Na lista dos 50 nomes da elite global da "Newsweek", por exemplo, há até quem fale português (Luis Inácio "Lula" da Silva). Mas portugueses, nem um para amostra.

A verdade é que não há memória, no passado recente, de olhar para os centros de decisão internacional e ver tantos portugueses em lugares de relevo. A começar por Bruxelas, onde Durão Barroso comanda há cinco anos, a partir do último andar do Berlaymont, o poder executivo do maior bloco comercial do mundo, formado por 27 estados europeus. Também de Bruxelas sairá, nos próximos tempos, o futuro embaixador da mais relevante representação diplomática da União Europeia - a de Washington -, João Vale de Almeida. Nos Estados Unidos, encontrará ao serviço das Nações Unidas homens como Jorge Sampaio (Alto Representante da ONU para A Aliança das Civilizações), António Guterres (Alto Comissário da ONU para os Refugiados) ou Victor Ângelo, o homem de confiança do secretário-geral Ban Ki-moon a chefiar a missão da ONU no difícil teatro do Chade.

No xadrez económico mundial também há peças portuguesas em acção. Três exemplos: Victor Constâncio, vice-presidente de Banco Central Europeu; António Horta Osório, um dos vice-presidentes executivos do grupo Santander e director não-executivo no Banco de Inglaterra; e Maria Ramos, a CEO do grupo financeiro ABSA.

por Gonçalo Venâncio, Publicado em 05 de Abril de 2010

Existe uma elite portuguesa global? É preciso definir o conceito "elite". "É um termo que aponta para o eleito, o escolhido. Não o eleito pelo povo mas o escolhido pela competência. A tradução democrática do conceito será meritocracia", assinala Adelino Maltez, professor de Ciência Política no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP).

Maltez acredita que "há uma propaganda sobre o estado exíguo" e que é bom não esquecer que, "na viragem do século XVIII para o século XIX, Portugal era a quinta potência mundial." "Governávamos um império com uma série de Estados. Tínhamos de ter uma elite." acrescenta. Mesmo em comparação com os Estados da sua dimensão, Portugal parece sair a ganhar: "A elite portuguesa é habilíssima quando está integrada em qualquer União Europeia", diz Maltez, ironizando com o período em que Portugal perdeu a independência para Espanha e ficou integrado no império dos Habsburgos (com sede em Madrid).


Mais do que reconhecimento, poder e influência, há outro factor que motivou a afirmação deste grupo de destacados portugueses. Adelino Maltez sumariza: "É verdade que Portugal se tornou pequeno para certas elites. E em momentos de crise ou definição de caminhos a elite tende a escapar."


Eles têm poder, influência e estatuto. Eis a nova elite portuguesa global