a Sobre o tempo que passa: <span style="font-family:georgia;color:red;">Novo primaz do novo supremo conselho</span>

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

19.10.04

Novo primaz do novo supremo conselho




Consta, nos bastidores das cardinalices universitárias, onde quase todos os passos são efectivamente perdidos, que a actual suprema autoridade do grande conselho dos manitus, Monsieur Charles Maurice de Talleyrand Périgord, está a chegar ao fim dos seus dias de trabalho ao serviço da pátria, mais de uma década depois da mesma pátria o ter aposentado como supremo orador do areópago da tribo, dado que é um homem razoável e sempre seguiu o benthaniano conselho do máximo prazer com o mínimo de dor e o mais prosaico e campo d'ouriquense lema do "bempregas frei Tomás".

Consta que um antigo reitor primaz aceitou avançar para a criação de uma nova instituição menos gerontocrática do que aquela que o dito cujo reformador moldara ao sabor dos respectivos caprichos, fazendo e desfazendo bonecos, conforme os sopros de ouvida que lhe ia chegando.

Consta também que a mesma insubstituível criatura, afinal um mero bispo que não enfiou o barrete cardinalício, apesar de sempre se ter assumido como patriarca, atingiu as culminâncias do respectivo múnus, com alguns a recordar-lhe que, antes, até chegou a ser purpurado "kingmaker" sem a prévia recepção das ordens adequadas, sem tonsura, mas com muita censura.

Em desespero, a provisória suprema autoridade, depois de ter descoberto no respectivo ficheiros de dependentes um certo seguidor que professa fé santanista, logo passou a ter longos repastos conspiratórios com tal jagunço, só porque este espera a nomeação de adequado conselho promotivo e pelo motivo evidente.
Entretanto, vários candidatos a biógrafos da quase ex-suprema autoridade fazem fila à espera de confidências, junto a um velho palácio, também cardinalício, mas enganando-se no endereço, dado que, agora, a celebridade ocupante é outra. Aliás, bastava dar um salto aos arquivos de Moscovo, no pós-guerra, ou de Washington, nos anos sessenta, lendo o que não foi consultado por José Freire Antunes, que não sabe, nem tem que saber, russo nem quimbundo.



Contudo, um quarto de hora antes de deixar de poder fazer mais estragos institucionais, o dito cujo continua a estragar a vida aos que não lhe querem obedecer, promovendo expurgos, entronizando inutilidades e conseguindo empalear algumas ingénuas criaturas que pensam poder continuar a jogar com um pau de dois bicos.

O servidor dos quatro regimes, cuja foto, quando tinha metade da idade que hoje possui, aqui lhes deixamos, não terá assim oportunidade de assumir a liderança do quinto império e consta que, sobre ele, já estão em esboço muitas autobiografias não autorizadas. Qualquer jornalista disponível que ainda queira um tacho docente em qualquer instituição dele dependente poderá candidatar-se à tarefa, dado que a recompensa será garantida.




Qualquer semelhança entre o texto emitido e as actuais circunstâncias não é apenas coincidência. A história constitui, na verdade, o género literário mais próximo da ficção. E quando se repete tanto redunda em tragédia como na presente comédia.