a Sobre o tempo que passa: Que sejas um pedro-engulho neste charco...

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

6.10.04

Que sejas um pedro-engulho neste charco...



Ainda nada disse sobre o PS que agora diz não ser mais do mesmo e que não quer ser alternância, mas alternativa. Está clarificado. Chega.

Eis Sócratas, a nova era, a vida nova, a esquerda moderna, ainda não pós-moderna, a geração que usa teleponto, com jovens quarentões que prometem o elixir da juventude eterna, graças às formosas "barbies" que permanecem, graças às quotas e aos cotas. Vale-nos o velho Guerreiro, o Emídio que foi secretário-geral do PSD e que só por ser 104 anos foi considerado pela SIC um histórico do PS. Ele disse tudo: Sócrates é um "pedragulho" neste charco...

E é. Cita modernizadamente Kennedy, o John de quase há meio século, o tal que se foi em Dallas, depois ter ido com a mafia e a Marylin, e de nos ter mandado p´ró Vietname. Pois que prometa novas fronteiras, mas que não nos queira pôr na lua.

Infelizmente, Kennedy também é o ai-jesus de Santana Lopes. Porque Sócrates e Lopes são dois macacos para o mesmo galho, ou dois galifões para a mesma capoeira. Ambos cheiram a jovens educados pelo "hollywoodesco", com o novo líder do PS a estar mais próximo da mentalidade do cicneclubista de esquerda e o nosso primeiro a gostar mais da cowboyada...

Mas isso das "novas fronteiras" é má tradução em calão. Porque a fórmula norte-americana, que serviu de "slogan" ao John Kennedy, assenta na velha ideia ianque de "espírito de fronteira". Que era não haver fronteiras para a conquista do "far west", matando os índios e usurpando as terras dos chicanos, com muitos escravos negros, a fim de atingir-se o Pacífico.

Pouco me rala... Apenas temo uma ideia que quase não emergiu no Congresso. A radicada emoção de pátria da velha tradição maçónica e republicana do Partido Socialista, talvez porque Manuel Alegre a corporizou e talvez porque o João Soares citou o Jaime Cortesão.

Raramente também falaram em povo, com a ressonância de António José de Almeida. E Nação quase pareceu conceito proibido. Coisas de que o tal Kennedy nunca abdicou, usando o velho conceito anglo-americano de "comunidade".

Esperemos que Sócrates possa falar mais com Jaime Gama. Que diz povo e sabe dizê-lo. Que diz pátria e não tem medo. Que teoriza nação e não é parvo. Porque sabe que tais coisas não são velharias pouco dadas às modernices engenheirais.

Sócrates precisa urgentemente de raízes. Porque não é devoto formado nas neo-tomices franciscanas e pintasilgueiras como era Guterres. Porque não parece ser um inveterado maçon da velha e boa escola. Porque nem sequer tem pergaminhos de longo e radicado antifascismo. Até nem veio da extrema-esquerda estudantil ou laborista.

Que ele não seja mais um mais do mesmo de importação anglo-americana e que consiga roubar a Pedro a brilhantina e a água de colópnia da modernização e do decisionismo.

Sei que ele sabe ler dossiers, nota-se que gosta do trabalho de equipa e que tem experiência no discurso económico e financeiro. Conhecendo o europês não precisa de tecnocratas para descodificarem o dito e vai naturalmente causar mossa no situacionismo.

Que se saiba libertar da formatação tentadora da salsicharia teledemocrática é o meu voto. Que use e abuse dos Gamas e dos Coelhos, os quais lhe podem dar a necessária macropolítica.