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Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

12.1.05

A epidemia da amoralidade continua sem cura....



Quem hoje teve o cuidado de ouvir o chamado "forum" da TSF deve ter reparado como saiu vencedor o ministro Sarmento e como saiu penalizado o Partido Socialista. Descontando a eventual organização dos militantes laranjas, tendo em vista o assalto a este pequeno segmento da opinião pública, quem tiver a humildade de ouvir a "vox populi" deparará com uma estranha dissonância entre esta e a dos que se assumem como "elites", nomeadamente os militantes desta blogosfera. Embora não queira reivindicar o privilégio de ter contactos imediatos de primeiro grau com o país real, sinto que, no próximo acto eleitoral, poderá agravar-se a distância entre as cortes intelectuais e o país que votou no Zé Castelo Branco, que lê o "24 Horas" ou que assiste, entusiasmado, ao telejornal da TVI.

A libertação é um processo complexo e de médio prazo. Especialmente num regime de democracia estabilizada como já é o nosso. Na Itália, durante décadas, o sistema de controlo levado a cabo pela partidocracia (é de lá que vem o nome e a teorização desta realidade) e pela aliança desta com os submundos da corrupção, das mafias e do terrorismo, não foi eliminado com o pluralismo constitucional, a integração europeia e as eleições justas e livres. E quando, depois das "mãos limpas", se mudou foi para assistirmos à ascensão de Berlusconi, assente na inequívoca vontade popular. Ninguém acredite que, por cá, teremos um milagre, com a eventual utilização da técnica do rotativismo.



As piores crises políticas são aquelas onde nem sequer é possível uma consensualização quanto às próprias causas da crise, quando decidimos tomar o remédio que alivia a dor, mas mantém a epidemia. Também no último quartel do século XIX, o liberalismo monárquico português se enrodilhou em decadência e a crise levou décadas, infestando a própria República que não conseguiu implantar o sonho do "bacalhau a pataco", dado que, depressa entrou no regime do "mais do mesmo", onde o aficaz oportunismo dos "adesivos" acabou por sair vencedor.

Todos os sinais que nos chegam apontam para que se mantenha esta "anarquia mansa" e apenas se dê nova forma à permanente "ditadura da incompetência". E isto porque não assumimos a necessidade de uma efectiva moralização da política. Desde que o maquiavelismo do "homem de sucesso", injectado pelo cavaquismo, aqui pegou de estaca, quase todos passaram a balbuciar o evangelho de um politiquês, onde se considera que tem razão quem vence, criando-se não uma imoralidade generalizada dos detentores de cargos políticos, mas uma efectiva a-moralidade a que deram o nome de política pura. E a epidemia propagou-se. Agora é o povo que está doente e a cura não se fará com discursos da quinta das celebridades, com quarentenas ou vacinações generalizadas, mas antes pelo mais difícil dos percursos: a educação, onde deveremos começar pelas próprias elites.