a Sobre o tempo que passa: O partido da ditadura do relativismo

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

19.4.05

O partido da ditadura do relativismo



Foi hoje fundado, já lá vão trinta e dois anos, um partido socialista, ainda marcadamente marxista, nos arredores de Bona. Não se contam, entre os fundadores, Diogo Freitas do Amaral, antes da deriva democrata-cristã, Manuel Alegre, antes de estar em Argel, José Sócrates Pinto de Sousa, antes de se envolver com o PPD, na fase pré-social-democrata da instituição, bem como os ex-pré-marxistas-leninistas-cunhalistas Pina Moura, Vital Moreira e José Magalhães. O senhor de bigodes descendentes que se encontra na foto, à direita baixa, ou em primeiro plano, conforme as sensibilidades do observador, resistiu a sucessivas lavagens de lixívia a que foi sujeito. Também não podiam fazer parte da foto António de Almeida Santos, Vítor Constâncio, Jorge Sampaio, António Guterres, Ferro Rodrigues e o já referido José Sócrates, que, então, andavam por outras paragens. Isto é, sempre tiveram direito de preferência nas sucessivas sucessões a Mário Soares, emigrantes que vieram de outras estações de caminho de ferro, já que ser histórico, indígena e fundador em qualquer partido dá sempre lugar a não ter lugar de presidente e secretário-geral.

Por outras palavras, um dos principais partidos da democracia portuguesa teve a vantagem de não ser daquelas coisas vanguardistas que antes de o serem já o são. Nasceu e cresceu, alargou-se e minguou, foi marxista e deixou de ser marxista, reciclou comunistas e democratas-cristãos, maoístas e ministros do salazarismo-caetanismo. Transformou-se num verdadeiro artista português, dado que sempre foi marcado por aquilo que o cardeal Ratzinger qualificou como a ditadura do relativismo, da tal política de experiência feita. Como seu adversário de sempre, ontem como hoje, desejo aos sinceros amigos que aí militam que ainda cá estejam daqui a um século, por intermédio dos netos, se ainda existir aquilo que nos une, Portugal.



Ao contrário do que foi insinuado por um correspondente de anónimo "mail", reconheço a total coerência do Professor Doutor Diogo Freitas do Amaral. Ainda me recordo da magnífica entrevista que o mesmo fundador do CDS concedeu ao primeiro número do jornal "A Rua", dirigido por Manuel Maria Múrias, onde o actual ministro deste governo socialista declarava, com toda a segurança doutoral, que "Salazar era socialista". E com isto não digo que o filho de um secretário de Salazar alguma vez tenha sido salazarista. Antes pelo contrário, acaba de dar a sua preferência ao segundo termo.