a Sobre o tempo que passa: Companhia das Lezírias, de Farrobo ao Espírito Santo

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

11.5.05

Companhia das Lezírias, de Farrobo ao Espírito Santo



Já durante o reinado de D. Maria II, o ministro Silva Carvalho decidiu vender em hasta pública vários latifúndios pertencentes à Coroa, à Casa da Rainha, ao Infantado e à Patriarcal, cujas fronteiras se estendiam entre a Golegã e a Comporta num total de cerca de 50 000 hectares. E assim, com seis grandes accionistas, é constituída em 1836 a Companhia das Lezírias do Tejo e do Sado, que viria a arrematar o lote de terras por dois mil contos, uma fortuna para a época.

Corria o ano de 1835, em pleno devorismo. Quando surgiram as nossas primeiras privatizações. Uma comissão presidida pelo conde Farrobo, onde, como figura decorativa, estava Mouzinho da Silveira, misturou negocismo com política e deu luz a um decreto sobre a venda das Lezírias em 3 de Novembro de 1835, sem que o governo seguinte tivesse revogado o diploma. Logo surgiram vigorosos protestos de pares e deputados, como Fronteira, Loulé, Taipa, Sá da Bandeira, Passos Manuel, João Gualberto de Pina Cabral, Jerónimo Veloso da Cruz, António Dias de Oliveira, José Plácido Campeã e Bernardo Joaquim Pinto.

Alcamé, uma das duas ermidas construídas na solidão da lezíria. Alcamé deriva de uma expressão árabe que significa “lugar para descansar à sombra”. Mas árvores não há, nem portas abertas que nos protejam do calor do meio-dia...


Mais de um século e meio, aqui e agora, ainda há Lezírias, sobreiros e Portucale e muitos consideram que o que é bom para o BES é bom para Portugal. E o poder judicial está agora vinculado às angústias do crime de tráfico de influências, onde a prova é, de certo, muito pouco evidente, dado que os arguidos sempre podem ser considerados como cobaias, dado tratar-se de um crime onde ninguém, até hoje, foi condenado. Quid juris? Apenas sabemos que, no dia 9 de Setembro de 1836, o devorismo foi derrubado sem efusão de muito sangue, numa dessas nossas queridas revoluções com vivório e foguetório. Por mim, continuo fiel à Revolução de Setembro, sempre, sempre pela Santa Liberdade!