a Sobre o tempo que passa: Da centenária árvore que resistiu

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

18.8.05

Da centenária árvore que resistiu



Imagem picada em Dias com árvores

Olho, da janela, a centenária árvore que resistiu à fúria dos planeadores. A terra castanha, o melro que saltita no jardim. O castanho. O verde. O barulho da água na cascata. Os carros que ao longe circulam. Sinto a cidade. O passeio da manhã, para sentir a gente que passa, as ruas da calçada, a praça velha, os nomes que existem em todos os recantos das cidades portuguesas. Sinto a gente. E a sentir os outros me vou sentindo. Vivo. E apetecendo renascer. No olhar profundo, na esperança, na âncora que prende o balançar do corpo. Na cidade que passeia. Na memória. Nas relvas orvalhadas. Nos lírios que são as flores que se destacam no jardim.



Imagem picada em Caminho de Santiago

Apetece ficar aqui. Numa qualquer casa à beira-mar. Com quem me apetecia para sempre ficar. Ficando assim neste escrever-me. Com o tempo todo que me resta, assim cumprindo a missão de viver. Com o sinal do que há-de ser, do que há-de vir. Venha o tempo todo que vier. Para que a tempestade me traga um tempo de pausa. O sinal de quem sou que não traí. Para que a vida seja mais sonho, templo que semeie o fundo tempo que outros hão-de colher. Que o tempo todo seja raiz, da centenária árvore que vão crescendo em mim. Mesmo que semeie sem terra que me dê guarida e estas palavras se percam nas páginas efémeras. Porque não sou eu, mas outros que antes de mim me escrevem, para que noutros germinem, depois de mim, o que há-de ser nós. Aqui.