a Sobre o tempo que passa: Das bácoras bundas aos báculos pimbas, com coelhos doentes na cartola e círculos uninominais de gambozinos

Sobre o tempo que passa

Espremer, gota a gota, o escravo que mantemos escondido dentro de nós. Porque nós inventámos o Estado de Direito, para deixarmos de ter um dono, como dizia Plínio. Basta que não tenhamos medo, conforme o projecto de Étienne la Boétie: "n'ayez pas peur". Na "servitude volontaire" o grande ou pequeno tirano apenas têm o poder que se lhes dá...

16.8.05

Das bácoras bundas aos báculos pimbas, com coelhos doentes na cartola e círculos uninominais de gambozinos



O PS acaba de tirar um coelho da cartola: a tradicional promessa da mistura de círculos uninominais com um grande círculo nacional, coisa que há dez ou vinte anos podia ser interessante, mas que hoje padece de algumas dificuldades, dado que uma grave doença transmissível ao Homem, a tularémia, está a afectar coelhos e lebres, coisa que pode infectar os humanos que manuseiem animais portadores da bactéria ou ingiram a sua carne. Valia mais repararmos como já temos incêndios em pleno mar, com armadores e tripulações que apenas se fiam na Virgem e não correm, mas que prudentemente escolhem o lugar do sinistro diante de uma praia plena de motas de água, que acabaram por evitar o desastre.



Por outras palavras, a ilusão retórica de reformar o sistema político, depois de ilustres comissões de reforma do dito terem preopinado em circuito mais ou menos fechado, descobre uma centenária novidade: a introdução de círculos uninominais, como aconteceu no século XIX, quando a Regeneração voltou a ser devorismo corrupto e perdeu autenticidade liberdadeira. Este viródisco-e-tocómesmo, típico do rotativismo, acontece porque tanto o PS como o PSD, com o PP na albarda, se esgotaram.



Acresce que os donos e senhores do sistema que manipula a presente canalização representativa já têm consciência que podem controlar todas as porosidades e marginalidades do mostrengo da democratura, como se demonstra pelo desejo dos pequenos partidos que não têm pé na coisa quererem aceitar um qualquer lugarzito numa coligação autárquica, nem que seja um assento de deputado municipal para poderem ter uma vozita na montra comunicacional da demagogia. O que ainda há uma década poderia ter sido mobilizador para o recrutamento político será hoje simples vestimenta enganadora que será presa fácil do caciquismo e do aparelhismo e das formas indirectas de corrupção, geradoras do indiferentismo.



O decadentismo é manifesto. Ainda de anteontem para ontem, a estação televisiva que os castelhanos compraram recentemente acabou a noite com uma porcaria, com um brasileiro qualquer a entoar uma "oração à bunda", macaqueando o "pai nosso", com figurantes recrutadas nos excedentes das discotecas e bares de alternes e acompanhantes, para, pela manhã, transmitir em directo as cerimónias de Fátima.



Dos bácoros brasílicos aos episcopais báculos, sempre o mesmo ritmo pimba de ganhar audiências, enquanto nos vamos distraindo com a caça aos gambozinos desta reforma do sistema político, para não falarmos do gigantesco défice comercial com que os castelhanos nos vão engolindo. Vale-nos que Sócrates está prestes a regressar de seu safari, que apenas houve uma dúzia de mortos nas estradas, com o regresso das primeiras férias e que cinquenta independentes do distrito de Leiria apoiam a candidatura de Mário Soares.