Esta implosão mental que pode preceder a pior das guerra civis que é a guerra civil fria, ou o nosso sindroma de timor
Hoje, face a anunciada greve, parece que não haverá peixe fresco, tal como a temperatura vai voltar a descer, enquanto a aparente a calma regressa às ruas de Timor e poderão abrandar estas sucessivas pragas de aranhas, mosquitos e borboletas, face à explosão de momentos de Verão em dias e noites de plena Primavera. Por mim, lá continuo submetendo-me para sobreviver, com vontade de lutar para continuar a viver, nesta solidão sem tribo, onde, de vez em quando, lá me vou rendendo à beleza, à sensibilidade e à autenticidade com que se costumavam tecer as artes da poesia e que fui reencontrar, na tarde do dia 29, nas palavras vida do José Félix Duque, a quem deixo o meu testemunho de cumplicidade de quem, no pretérito, por aí sonhou poder semear.
Basta que nos livremos do sindicato das citações mútuas dos chamados literatos oficiosos e das respectivas seitas de controlo, que tão mal têm feito à cultura viva, como bem o podemos confirmar quando olhamos, numa casa dita de Fernando Pessoa, os efeitos do decretino de um presidente de câmara, aliado ao decretino de outros cretinos, transformando outros pretensos aristocretinos em praga de bustos e arabescos que nos toldam as paredes. Nunca mais lá porei os pés. A memória de Pessoa nunca devia ter caído na feudalização dos amigalhaços do culturalmente correcto, mas de vistas curtas! Basta lembrar-me de conversas que mantive com Reis Ventura sobre os tempos de vida do nosso Camões do século XX.
Não pensem, estimados leitores, que sofro do complexo da teoria da perseguição, que me considero vítima ou cordeiro sacrificado pelo actual situacionismo político ou cultural, até porque não sou candidato a qualquer lugar ou a qualquer renúncia. Já renunciei a tudo aquilo que este e anteriores poderes me ofereceram e tenho, nestes momento, suficientes amigos em lugares cimeiros que cederiam a uma qualquer cunha que lhes metesse, incluindo a de a receber, em troca favores que, outrora, lhes prestei. Apenas considero que o poder é cada vez mais incompatível com a autoridade e a parcela desta que conquistei por concurso público, filhos criados e obra experimentada será tanto mais alta quanto menor for o meu transacionismo com as teias deste sobe-e-desce da fama, ou das maiorias de conjuntura que levam alguns aos ministeriais poisos.
Também não me considero como dos poucos que se sentem homens livres, porque felizmente me sinto muitísisimo bem acompanhado, não precisando de fazer apelo àquela "consciência tranquila" dos que, tendo rasca na assadura, elaboram os tais discursos de justificação, típicos dos que sofrem um desaire ou um desastre que os leva ao pelourinho da opinião pública. Prefiro continuar a apelar ao bom senso.
Quem leu as opiniões que a senhora ministra da educação pré-universitária teve sobre certos professores e viu a reportagem da RTP de ontem sobre a matéria, pode concluir que atingimos um certo ponto sem retorno que nos pode atirar, não apenas para a continuidade desta decadência, mas, sobretudo, para aquele vazio institucional, onde, não havendo ideia de obra, desaparecem as manifestações de comunhão e de nada valem os autores e interpretadores de estatutos e regras heterónomas.
Da decadência, sempre podemos sair pela regeneração, produzida pela consciência de crise. Da falta de doutrinas, crenças, valores e princípios, apenas nos podemos iludir com politiqueirices neomaquiavélicas e tacticismos, onde abundam, como cogumelos daninhos, muitos hermeneutas de regras alienígenas, os tais que se vão vendendo em avenças, pareceres e consultas, e a quem chamamos juristas, ou passeando-se nos palcos e bastidores dos holofotes da chamada crítica literária ou artística, a tal dos que, impotentes na sua criatividade, vão ditando, para os outros, aquilo que não sabem fazer, mas que lêem e traduzem de coloridas revistas que, do estrangeiro ou da seita, nos trazem sinais de sítios onde o pensamento ainda têm pátria e onde as pátrias, mesmo que sejam da antipátria, ainda têm pensamento.
A pior das crises colectivas não é sermos extintos por uma invasão ou pela bancarrota, mas antes pela implosão mental, que, às vezes, precede a pior das guerras civis que é a guerra civil fria. Basta que os pretensos recriadores das instituições saiam de sua ausência feudalmente presente e, utilizando a técnica gerontocrática da conspiração entre avós e netos, nos decapitem com seus ódios ao presente e ao futuro. Basta que volte a entender-se a droga da revolução como "Prec", premiando todos os processos de traição intitucional, ou de execrável vindicta, através do discurso faccioso ou demagógico.
Compreendo a praga de aracnídeos que nos faz enredar no sindroma de Timor, reparo que, em vez de um Estado Falhado, temos uma comunidade falhada que, muitos dias sofro, em altas horas de um sono sem dormir, consumido pela revolta individual que me dá Norte. Onde a insónia não é a angústia da dúvida, mas apenas a constatação daquilo que tenho vindo a prever e a sentir difusamente nos sinais dos tempos.
Já não tenho idade para depressivas revoltas ou para ilusórios encantamentos com os falsos D. Sebastião. Prefiro o sinuoso silêncio ao remorso. Prefiro dizer incomodamente, à cobardia dos que se abstêm, que crises que fazem arder Timor não são causas, mas sintomas, meras consequências das mesmas causas que, também por cá, nos amarfanham e que, de um momento para o outro, poderão explodir em novas pragas de aranhas, mosquitos e borboletas, quando os ovos da podridão demonstrarem que os parasitas nos continuam a corroer por dentro e a ser condecoradores e condecorados de um qualquer 10 de Junho usurpado, sem roteiros de luta pela inclusão.
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